domingo, 31 de dezembro de 2017

'Mourir à Madrid': Um documentário clássico que mostra quais foram as causas da Guerra Civil Espanhola! - Marcos Doniseti!

'Mourir à Madrid': Um documentário clássico que mostra quais foram as causas da Guerra Civil Espanhola! - Marcos Doniseti!
'Morir en Madrid': Excelente documentário que mostra a evolução dos conflitos políticos e sociais que geraram a Guerra Civil Espanhola. Ele foi indicado ao Oscar em 1966. 

'Mourir a Madrid' é um excepcional documentário, dirigido por Frédéric Rossif. Ele mostra quais foram as causas da Guerra Civil Espanhola e porque as forças mais reacionárias acabaram vitoriosas no conflito, no qual morreram cerca de 1 milhão de pessoas em dois anos e nove meses de guerra. 


O documentário é muito esclarecedor a respeito dos conflitos políticos e sociais que provocaram essa que foi, sem dúvida, a 'Guerra Civil Espanhola' (1936-1939), e que se transformou na primeira batalha da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). 

Afinal, todas as principais potências europeias, mais os EUA, se envolveram, de uma forma ou de outra, no brutal conflito espanhol: Grã-Bretanha, Alemanha Nazista, Itália Fascista, França URSS. Destas, somente França e, principalmente, a URSS ajudaram ao governo democrático da República. 

Mas, no caso francês, pois havia uma divisão muito forte dentro do governo (também de Frente Popular) e do país. Uma boa parte dos franceses apoiou Franco e, ainda, pressionou o governo do país para que recusasse qualquer ajuda à República espanhola. A França possuía muitos movimentos políticos de Direita e de Extrema-Direita que simpatizavam com Franco, Hitler e Mussolini, sendo que os mesmos contavam com significativo apoio popular. 
François de La Rocque liderava um movimento de características tipicamente Fascistas (o Croix de Feu). Em 06 de Fevereiro de 1934 ele comandou seus seguidores numa tentativa de Golpe de Estado, tentando imitar o seu ídolo (Mussolini), promovendo uma espécie de 'Marcha Sobre Paris', mas que acabou fracassando. 

Exemplo disso foi o movimento de Direita Radical chamado 'Croix de Feu', liderado por François la Roque, que possuía uma força paramilitar própria (chamada de 'Dispos'), defendia a instalação de uma Ditadura, atacava o Liberalismo e o Socialismo, bem como defendia o Corporativismo. 


Desta maneira, a 'Croix de Feu' reunia as principais características de um movimento tipicamente Fascista. 

As causas da Guerra Civil Espanhola foram essencialmente internas, mas as questões envolvidas eram as mesmas que afetavam outros países da Europa neste período: 

- Luta de classes, com o fortalecimento das mobilizações promovidas por operários e camponeses, que lutavam por reforma agrária, melhores salários, leis trabalhistas e, até, por uma Revolução Social que destruísse o Capitalismo e criasse uma sociedade igualitária.

No caso espanhol, uma parte deste movimento era mais radical e queria também destruir o Estado, a Igreja e o Capitalismo: Eram os Anarquistas ou Anarcossindicalistas, representados pela CNT-FAI, e por uma minoria dos Socialistas, que eram representados pelo PSOE e pela UGT (seu principal líder era Francisco Largo Caballero, que foi o primeiro líder do governo Republicano, entre 1936-1937). 
Cartaz Republicano estimulando a defesa de Madrid por parte da população. A criação de cartazes, durante a Guerra Civil Espanhola, foi de grande importância. Afinal, uma grande parte da população espanhola era de analfabetos. 

Uma outra ala, mais moderada, queria reformar e modernizar a Espanha, mas sem promover uma Revolução Social, o que era o caso da maioria dos Socialistas, dos Comunistas, da Burguesia Liberal e da Classe Média;


A) Rejeição às mudanças e à modernização por parte das forças conservadoras (Igreja, Exército, Latifundiários);

B) Crescente papel dos jovens e das mulheres na sociedade;  

C) Industrialização e urbanização, que enfraquecia progressivamente os poderes da Igreja Católica e dos Latifundiários, que exercia uma influência bem pequena nas regiões mais industrializadas e nas maiores cidades (Barcelona, Madrid, Valência, Bilbao);


Cartaz do PCE chamando os operários, camponeses, soldados e intelectuais a se unirem ao Partido e em defesa da República.

D) Expansão das classes médias instruídas e urbanas, que lutavam para participar do sistema político, o que era barrado pelas forças mais reacionárias do país;


E) Lutas de algumas regiões por maior autonomia em relação ao governo central. Na Espanha, este era o caso do País Basco e da Catalunha, em especial. As forças Franquistas queriam o contrário, construindo um Estado totalmente centralizado. 

Com isso, depois que venceu a Guerra Civil, Franco chegou até a proibir que as populações da Catalunha e da região Basca usassem as suas línguas, obrigando-as a falar apenas o Castelhano.

Também vemos, no documentário, quais eram as forças políticas e sociais que entraram em choque na Guerra e quais os motivos que as levaram a participar do conflito: 
Hitler e Franco juntos. Hitler deu apoio decisivo para a vitória de Franco na Guerra Civil. Em troca, Franco entregou para controle alemão minérios que foram importantes para a indústria bélica germânica. Ele também enviou uma 'Divisão Azul', com 47 mil soldados, que lutou ao lado dos alemães na invasão da URSS. Poucos sobreviveram. 

A) De um lado, as forças reacionárias, contrárias às mudanças políticas, econômicas, sociais e culturais que ocorriam no país, pois as mesmas levavam a uma crescente perda do seu imenso poderio e dos seus privilégios. 


Estes eram os casos dos Latifundiários, do Exército, da Monarquia e da Igreja Católica, cujo apoio vinha das regiões mais pobres e atrasadas do país (as áreas rurais, onde ainda vivia mais da metade da população espanhola);

B) Enquanto isso, outras forças políticas e sociais lutavam para aprofundar e acelerar as mudanças e promover a modernização da Espanha: Operários, Camponeses, Classe Média instruída, Industriais, Nacionalistas bascos e catalães, jovens e mulheres. 

A base social destas forças se concentrava nas regiões mais ricas, industrializadas e urbanizadas do país: Catalunha, Valência e País Basco, em especial. 
Brigadistas internacionais que foram lutar do lado Republicano na Guerra Civil Espanhola. A ida deles para a Espanha era organizada pelo PCF (Partido Comunista Francês, liderado por Maurice Thorez).

Os Anarquistas (ou Anarcossindicalistas) conseguiram, também, conquistar um grande apoio entre os camponeses e trabalhadores rurais miseráveis da região Sul da Espanha, pois estes eram brutalmente explorados pelos Latifundiários. Estes contavam com o apoio da Igreja e das forças policiais, motivos pelos quais os camponeses sulistas espanhóis repudiavam o Estado, o Capitalismo e a Religião. 


Isso explica o grande apelo popular do discurso Anarcossindicalista na região sulista espanhola.  

Os segmentos reacionários temiam os efeitos das mudanças realizadas pelo primeiro governo Republicano (de perfil progressista e liberal, que durou de 1931 a 1933), que promoveu a reforma agrária, fez investimentos maciços na educação pública, aumentou salários, criou leis trabalhistas (jornada de 8 horas diárias, a licença-maternidade, as férias remuneradas,), reconheceu o direito de voto para as mulheres, reformou o Exército e proibiu cultos religiosos. 

Este governo Republicano era um governo de perfil Iluminista, cuja principal fonte de inspiração era a Revolução Francesa de 1789-1799. Mas, entre 1935-1936, a divisão das forças progressistas, que entraram em choque entre si, enfraqueceu o governo Republicano. 
Cartaz das Brigadas Internacionais. Cerca de 60 mil brigadistas foram lutar em defesa da República. Eles eram originários de 54 países. Inclusive, tivemos 40 brigadistas brasileiros, sendo que um deles foi Apolônio de Carvalho.

Isso aconteceu porque alguns segmentos sociais dos Republicanos entendiam que as mudanças promovidas pelo governo eram insuficientes e queriam acelerar e radicalizar o processo de transformação. Este era o caso dos Anarquistas e de setores radicais dos Socialistas (cuja maioria era reformista, mas não revolucionária).  


Com isso, as forças mais conservadoras venceram as eleições de 1934 e retomaram o controle do governo espanhol. Daí, elas procuraram reverter as principais mudanças que o governo Republicano progressista havia promovido.

Esse retrocesso fará com que as forças políticas e sociais mais progressistas (Anarquistas, Socialistas, Comunistas, Republicanos de Esquerda e Burguesia Liberal) se unam. 

E essa união as levará a criar a chamada 'Frente Popular', que venceu (por estreita margem) as eleições para o Parlamento espanhol em Fevereiro de 1936. 

Assim, a Espanha voltou a ter um governo Republicano e progressista novamente. E com isso, as mudanças do governo de 1931-1933 foram retomadas. 
Mulheres que combateram do lado Republicano na Guerra Civil Espanhola. As mulheres Anarquistas criaram uma organização chamada 'Mujeres Libres', que foi fundada em 1936 e chegou a possuir 21 mil integrantes. A luta delas se davam tanto contra o Capitalismo explorador, como contra o domínio patriarcal na sociedade. Suas lutas anteciparam os movimentos feministas da década de 1970. 

E foi isso que levou as forças mais retrógradas da Espanha a se unir para promover um Golpe de Estado que derrubasse o governo da Frente Popular. Mas esta tinha substancial base popular organizada, que lhe dava sustentação: partidos políticos, sindicatos, centrais sindicais, movimentos de jovens e mulheres.


E tais segmentos progressistas resistiram ao Golpe das forças Reacionárias, que estourou em 17/07/1936,  graças à esta base social organizada que possuía. 

Com isso, o Golpe Reacionário foi apenas parcialmente vitorioso. 

No início da Guerra Civil, os golpistas conseguiram assumir o controle apenas das regiões mais atrasadas do país: parte agrária do Sul (dominada pelos latifundiários) e o Norte, no qual a Igreja Católica predominava. Já nas áreas mais ricas e industrializadas, as forças progressistas da Frente Popular foram vitoriosas, conseguindo derrotar os golpistas. 

Se dependesse apenas das forças políticas e sociais internas, é muito provável que a República fosse vitoriosa. Afinal, ela controlava as regiões mais ricas e tinha as reservas de ouro do país em suas mãos. Mas tal vitória não aconteceu, pois o fator que acabou decidindo o resultado final do conflito foi a atuação das grandes potências mundiais.
Dolores Ibárruri (La Pasionaria) discursando para uma multidão em Barcelona. Ela estimulou a Resistência até o final e dizia "Mais vale morrer de pé que viver de joelhos'. Ela terminava seus discursos usando da famosa expressão 'No Pasarán!'. 

Assim, Franco contou com o apoio descarado e gigantesco da Itália Fascista e da Alemanha Nazista que, somadas, enviaram mais de 90 mil soldados (passam de 100 mil se somarmos os 10 mil soldados enviados pela Ditadura de Salazar) e muitos armamentos modernos (aviões, blindados e artilharia), tais como os canhões de 88 mm e os aviões alemães Junker 52, Henkel 111 e Messerschmitt 109. 


Franco também contou com um significativo apoio dos setores privados dos EUA, da Grã-Bretanha e da França. Muitos industriais e banqueiros destes países ajudaram as forças franquistas com petróleo, empréstimos e veículos. A GM e a Ford forneceram milhares de veículos para os franquistas. 

Enquanto isso, a República contava apenas com o apoio limitado da URSS que, no entanto, evitou um envolvimento maior no conflito espanhol para não alarmar a França, a Grã-Bretanha e os EUA, com quem Stalin desejava forjar uma ampla aliança a fim de conter a expansão do Nazi-Fascismo. 

E tudo isso acontecia enquanto o governo da Grã-Bretanha promovia uma hipócrita, falsa e mentirosa política de 'não-intervenção', que foi inteiramente prejudicial apenas para o governo Republicano. 

Afinal, tal política foi totalmente ignorada pela Itália Fascista e pela Alemanha Nazista, que controlavam o acesso dos espanhóis ao Mar Mediterrâneo (impedindo a chegada de produtos e armamentos para as forças Republicanas) e enviaram armamentos e soldados em grande quantidade para as forças Franquistas. 
Aviões alemães Messerschmitt BF-109, que foram utilizados na Guerra Civil Espanhola, contribuíram fortemente para a vitória de Franco, que graças ao maciço apoio italiano e alemão dispôs de imensa superioridade aérea durante todo o conflito.

Logo, as forças franquistas sempre dispuseram de uma significativa vantagem em termos de forças militares, tanto no número de soldados (seus mortos e feridos eram repostos com mais facilidade e rapidez), quanto nos armamentos disponíveis (aviões, blindados, canhões). E também nunca faltou acesso a empréstimos externos por parte de banqueiros britânicos, franceses e estadunidenses para que Franco e seus aliados pudessem comprar o petróleo, alimentos, veículos necessários a uma guerra que durou dois anos e nove meses. 


Essa substancial ajuda externa que as forças Franquistas receberam, bem como o isolamento internacional da República, foi o fator principal que levou à vitória das forças franquistas na Guerra Civil Espanhola. 

Sem o apoio decisivo de Hitler e Mussolini, e do apoio disfarçado, mas significativo, dos EUA e da Grã-Bretanha, Franco jamais teria vencido a Guerra na Espanha. 

E o povo espanhol pagou um alto preço por esta vitória de Franco, que impôs uma Ditadura brutal, que procurou aniquilar toda e qualquer oposição, real ou imaginária, implantando um Estado Policial e Totalitário dos mais brutais e cruéis que já existiu na Europa, construindo campos de concentração, explorando trabalho escravo dos prisioneiros, eliminando fisicamente centenas de milhares de Republicanos. 
Chamberlain, Daladier, Hitler, Mussolini e Ciano durante as negociações que resultaram na assinatura do Pacto de Munique, que entregou a Tchecoslováquia e a Europa Central para o controle da Alemanha Nazista. Tal fato condenou a República Espanhola à derrota. A assinatura do Pacto representava a continuidade das políticas de 'Apaziguamento' e de 'Não-Intervenção' adotada por britânicos e franceses e que resultou no progressivo fortalecimento da Alemanha Nazista e da Itália Fascista no cenário europeu e mundial. 

Informações Adicionais:

Título: Mourir à Madrid (Morrer em Madrid);
Diretor: Frédéric Rossif;
Roteiro: Frédéric Rossif e Madeleine Chapsal;
Ano de Produção: 1963; País de Produção: França;
Gênero: Documentário; Fotografia: Georges Barsky; Música: Maurice Jarre; 
Narradores: Suzanne Flon; Germaine Montero; Pierre Vaneck; Roger Mollien e Jean Vilar;
Prêmios:  BAFTA Awards de Documentário de 1968; Prêmio Jean Vigo, de 1963, de Melhor Produção. 

Link:

A Guerra Civil Espanhola - Augusto Buonicore:

http://vermelho.org.br/noticia/283839-1

As 'Mujeres Libres' Anarquistas:

http://www.publico.es/politica/memoria-publica/80-anos-mujeres-libres-xxx-mujeres-libres-anarquistas-revolucionaron-clase-obrera.html

Vídeo - Documentário 'Morir à Madrid' na íntegra (legendado em Português):

'La Mujer del Anarquista' mostra as consequências da derrota na Guerra Civil para os Republicanos espanhóis! - Marcos Doniseti!

'La Mujer del Anarquista' mostra as consequências da derrota na Guerra Civil para os Republicanos espanhóis! - Marcos Doniseti!

La Mujer del Anarquista! - Contexto Histórico!
Filme 'La Mujer del Anarquista' mostra a fase final da trágica derrota da República na Guerra Civil, bem como mostra o que aconteceu com centenas de milhares de Republicanos espanhóis que buscaram refúgio em outros países (na França, em especial).

Este é um filme que possui uma ótima história, sendo que o seu maior atrativo é mostrar o que aconteceu com centenas de milhares de Republicanos espanhóis que fugiram da brutal perseguição promovida pela criminosa Ditadura Franquista (1939-1975).


'A Mulher do Anarquista' mostra alguns aspectos interessantes e relevantes da Guerra Civil Espanhola e do Pós-Guerra na Espanha, que é um tema que me interessa bastante e sobre a qual também leio muito, tais como:

A) A destruição provocada pelos bombardeios em Madrid, sendo que os edifícios ligados à Cultura sofreram muito... Afinal, Fascistas odeiam Cultura;

B) A falta de apoio externo para os Republicanos, pois o governo da França fechou a sua fronteira com a Espanha, para impedir que os Republicanos recebessem ajuda militar, em várias oportunidades;
Justo é um advogado Anarquista que trabalha na emissora de rádio dos Republicanos, em Madrid, por meio do qual estimula os espanhóis a continuar resistindo e lutando contra as forças do Franquismo Reacionário.

C) A divisão das famílias e de velhos amigos entre os dois lados em conflito: Republicanos X Franquistas;


D) A maneira como os Republicanos foram persguidos e humilhados, pelos franquistas vitoriosos, após a derrota para as forças reacionárias lideradas por Franco;

E) A decisão de Franco de exterminar os Republicanos, executando-os aos milhares, todos os anos, e por muito tempo, sem que tenham sido deixados documentos a respeito dessas execuções.  Assim, até hoje é impossível calcular o número de espanhóis que foram assassinados por sua Ditadura genocida. 

Oficialmente, foi possível descobrir a verdade sobre o assassinato de cerca de 150 mil espanhóis pela Ditadura Franquista, mas o número de execuções extra-judiciais foi muito maior. E não há documentos sobre o que aconteceu com estas pessoas. 

São os famosos 'desaparecidos';
Justo e Manuela se amam intensamente. Mas a vida que eles imaginavam será muito diferente, devido às tragédias provocadas pela Guerra Civil Espanhola. 

E) A tentativa dos Republicanos refugiados de (na França) continuar a lutar contra a Ditadura Franquista (planejando greves e até uma luta armada contra Franco, que ocorreu em 1944, mas que acabou derrotada);


F) A participação dos Republicanos espanhóis na Resistência Francesa e na Segunda Guerra Mundial, lutando ao lado de forças antifascistas francesas na África e na própria Europa. Muito deles acabaram sendo levados para campos de concentração nazistas. Exemplo disso foi o do escritor espanhol Jorge Semprún, que por muitos anos foi militantes do PCE (Partido Comunista Espanhol). 

O principal ponto fraco do filme, como disseram vários cinéfilos, é que faltou mais 'sal' no filme, que é conduzido sem paixão e de maneira muito fria. Uma direção melhor faria deste um filme superior, sem dúvida alguma. 

Apesar disso, vale a pena assistir ao filme, que possui as suas virtudes, como o bom trabalho dos atores, a ótima fotografia e o caráter realista dos fatos que ocorreram durante e após a Guerra Civil Espanhola.
Justo se despedindo da sua bela e jovem esposa, Manuela. A sua história resume o que aconteceu com centenas de milhares de Republicanos espanhóis após a trágica derrota na Guerra Civil. 

'La Mujer del Anarquista' também mostra aspectos importantes do que foi a Guerra Civil Espanhola, como a Ditadura Franquista conseguiu impor o seu poder a todo o país e mostra as dificuldades imensas que os Republicanos tiveram após a derrota, procurando refúgio em outros países.


Cerca de 400 mil espanhóis fugiram para a França, após a vitória franquista. Muitos deles chegaram a participar da luta contra as forças Nazi-Fascistas na Segunda Guerra Mundial, sendo que milhares de Republicanos lutaram ao lado dos franceses, entrando para a Legião Estrangeira ou lutando sob o comando do General Leclerc. Cerca de 10 mil deles acabaram em campos de concentração nazistas.

Obs1: A participação dos Republicanos espanhóis na Segunda Guerra, em especial na Resistência Francesa, foi significativa. Inclusive, quando as forças dos Aliados entraram em Paris, em Agosto de 1944, os Republicanos espanhóis (anarquistas, socialistas, comunistas) foram os primeiros a entrar na cidade. Eles faziam parte da chamada 'La Nueve', ou seja, a 'Nona Companhia do Terceiro Batalhão de Marcha do Chade' (que contava com 150 Republicanos espanhóis), que integrava a 'II Divisão Blindada da França Livre', também chamada de 'Divisão Leclerc', pois o seu comandante máximo era o General Philippe Leclerc. No total, cerca de 3500 Republicanos espanhóis lutaram no Exército Regular francês. 

Um exemplo dessa participação foi o escritor espanhol Jorge Semprún (Republicano que militava no PCE) e que foi levado para o campo de concentração nazista de Buchenwald. Ele escreveu vários livros a respeito dessa experiência, sendo 'A Escrita ou a Vida' o mais representativo dos mesmos. 
Durante a Guerra Civil Espanhola, o governo Republicano, eleito democraticamente, sofreu um bloqueio internacional (comandado pela Grã-Bretanha), o que dificultava a aquisição dos bens necessários à sobrevivência da população, motivo pelo qual se formavam inúmeras filas para comprar tais produtos. 

A trama do filme!


E no filme a história destas centenas de milhares de Republicanos refugiados é resumida nos personagens de Justo e de Manuela, em especial. Ele é um advogado que luta em defesa do governo da Frente Popular. Este era defendido por Socialistas, Comunistas, Anarquistas (caso de Justo), Republicanos de Esquerda e Liberais Burgueses. 

Enquanto ele participa da luta, a sua bela esposa (Manuela) permanece em sua casa, em Madrid, cuidando da residência e da filha (Paloma). Elas procuram acompanhar a Guerra Civil por meio do rádio, pois Justo é o locutor da emissora de rádio dos Republicanos em Madrid e que estimula o povo a conquistar resistindo às forças Franquistas. 

Na medida em que o desenvolvimento da guerra passou a ser cada vez mais favorável às forças reacionárias lideradas por Franco, Justo procurou convencer Manuela a ir para a França, junto com a filha, mas a sua bela esposa recusou-se a fazer isso. 

Justo temia que caso a cidade de Madrid caísse sob o domínio das forças franquistas, Manuela e a filha acabassem sendo mortas, pois era política dos Nacionalistas estuprar as mulheres e fuzilar aos simpatizantes dos Republicanos pelo simples fato de que eles eram... Republicanos.
Francisco e Justo: Dois irmãos em conflito, pois lutam em lados opostos na Guerra Civil Espanhola. Justo é Republicano e Francisco é Franquista (sendo um integrante da Falange, o movimento Fascista espanhol, que foi criado por José Antonio Primo de Rivera). 
Obs2: O futuro ditador Francisco Franco deixou bem claro, desde o início da Guerra Civil, que iria procurar exterminar os Republicanos depois que o sangrento e brutal conflito terminasse. E foi exatamente isso que ele fez, durante várias décadas. O número de vítimas da Ditadura Franquista é impossível de ser conhecido, mas estima-se em vários milhões de mortos. E isso aconteceu em um país que possuía apenas 26 milhões de habitantes em 1940. 

Manuela lhe diz, no entanto, que prefere ficar em Madrid, pois se tiver que morrer prefere que isso aconteça ao lado de Justo. Logo, o filme é, também, uma bonita história de amor, que mostra uma mulher de fibra e coragem e que se recusa a abandonar ou a esquecer do seu marido, mesmo que tenha que esperar muitos anos para que voltem a viver juntos. 


Manuela também possuía um irmão mais jovem (Luís), que era um pintor talentoso, mas que lutou no Exército Popular da República. E justamente por isso ele será perseguido pela Ditadura Franquista, tendo um destino trágico, tal como aconteceu com milhares de outros Republicanos.  

Justo também possui um irmão (Francisco), que é um Falangista e apoia Franco. Este é um fato histórico. Milhares de famílias espanholas se dividiram em função da Guerra Civil, com integrantes das mesmas apoiando tanto os Republicanos, quanto os Franquistas. 
Cenal real de aviões alemães (Henkel, Junker) e italianos (Fiat) bombardeando a cidade de Madrid. O filme faz uso de cenas reais da Guerra Civil Espanhola em vários momentos. 
Justo também acaba conhecendo uma excelente piloto de avião (Magdalena Lenin, uma comunista). Isso será algo importante, pois no futuro ela irá salvar a sua vida.

Após o final do conflito, que terminou com a vitória das forças Franquistas, graças ao apoio dos EUA, Grã-Bretanha, Alemanha Nazista e Itália Fascista (que lhes forneceram dinheiro, petróleo, veículos, soldados, armamentos), Manuela perderá completamente o contato com o marido por muitos anos. Apesar disso, ela nunca o esquecerá e jamais perderá a esperança de, algum dia, poder reencontrar o homem que ama. 

Desta maneira, Manuela e Paloma permaneceram em Madrid depois que a cidade caiu sob o domínio dos Fascistas, mas acabaram sendo humilhadas pelos Franquistas da cidade. 


Assim, seu antigo inquilino (Pedro Munoz, um simpatizante franquista) torna-se o proprietário de sua ampla e confortável residência, sendo que ela e a filha são obrigadas a pagar aluguel para o mesmo para poder continuar morando em um quarto da casa. E o irmão de Manuela (Luís) também é um soldado Republicano e que acaba sendo preso pelos franquistas quando os mesmos entram em Madrid, no dia 27/03/1939. 
Os bombardeios sobre a população civil de Madrid, realizados por aviões alemães e italianos, geravam uma grande destruição e matavam centenas de pessoas. O objetivo destes ataques covardes era destruir a vontade de lutar dos Republicanos.
Depois que perdeu o contato com Justo, Manuela sofre e chora muito. E para piorar a situação, ela perdeu o filho mais novo (Rafael) ainda criança. Rafael havia nascido quando Justo já havia partido. Logo, o pai jamais irá conhecer o seu filho. 

Com a vitória franquista na Guerra, Francisco, o irmão falangista de Justo, passou a ocupar um cargo importante no Ministério do Interior e tenta ajudar Manuela, de quem ele também gosta, mas ela se recusa a ter qualquer envolvimento com ele. 

Manuela procura por qualquer informação que possa levá-la a descobrir onde se encontra, afinal, o seu marido desaparecido. Ele vai ao cinema, onde vê um noticiário a respeito da libertação dos prisioneiros que estavam em um campo de concentração nazistas. Ela também compra revistas proibidas de um vendedor que trabalha com produtos no mercado paralelo, imaginando que conseguirá descobrir algo a respeito do destino do marido. Enfim, ela se recusa a se esquecer de Justo.

Até mesmo a filha, Paloma, diz para a mãe deixar aquilo de lado, mas ela nunca esqueceu o homem que ama. E a sua persistência acaba sendo recompensada, quando ela recebe uma carta da Cruz Vermelha dizendo que Justo está na França, em um campo de refugiados. Ela fica toda feliz e mostra a carta para Francisco. Este, por sua vez, mesmo sendo franquista, acaba ajudando Manoela em suas tentativas de reencontrar o marido.  
As propriedades de muitos Republicanos foram confiscadas pela Ditadura Franquista. No filme, isso também é mostrado. A família Munoz compra a casa de Justo e Manuela após o confisco. E esta última passa a morar em um quarto do antigo escritório de Justo, tendo que pagar um elevado aluguel pelo mesmo.  
A carta de Justo é de seis anos antes (1940), mas ela não se importa. Posteriormente, ela recebe a visita de um refugiado espanhol (Jaime) que informa Manuela que Justo está vivo e que esteve prisioneiro em um campo de concentração nazista de Mauthausen. 

Obs3: O campo de concentração de Mauthausen ficava na Áustria, a 20 km de distância de Linz, cidade natal de Adolf Hitler. Mauthausen foi o campo que mais recebeu Republicanos espanhóis. Entre 5 mil e 7 mil Republicanos morreram ali. O campo também foi o último a ser libertado pelas forças Aliadas. Cerca de 90 mil pessoas morreram neste campo nazista. 

Ela recebe uma carta do marido, que fala para que ela vá até a França, onde ele estará esperando, na cidade de Cerbere, que é uma pequena cidade localizada nas proximidades da fronteira entre França e Espanha. 

Na viagem, de trem, ela é observada por um policial franquista, que tentará fazer contato com ela quando chegar à França, mas Manuela recusa-se, percebendo que ele é um agente da Ditadura espanhola. Ela diz que tais agentes são 'Ratos'. 
Manuela pede a ajuda de Francisco, que acaba colaborando na tentativa dela de reencontrar o marido na França. 
Depois que chega a Cerbere, Manuela se encontra com Justo no hotel. Ele está bastante enfraquecido e com a saúde abalada, devido aos vários anos em que ficou prisioneiro no campo de Mauthausen. 

Na França, eles decidem recomeçar o casamento, mas Justo ficará muito triste com a notícia da morte de Rafael. Ele também terá problemas de relacionamento com a filha, Paloma, que vê o pai como se fosse um estranho. E isso irá piorar, depois, quando ela passa a suspeitar que Justo tem um caso com Madgalena, o que não acontece. Mas somente no final é que isso será esclarecido.

O que acontecia é que Justo fazia parte, junto com Magdalena e mais alguns refugiados espanhóis (Jaime, Pierre...) de um grupo de Resistência, que tentava manter viva a luta contra a Ditadura Franquista, por meio de atos de sabotagem. 

Quando Paloma e Manuela chegaram à Cerbere, eles estão planejando um atentado contra Franco, que irá pescar em um rio próximo à fronteira com a França. O grupo também produz pesetas falsas, que planejam levar para a Espanha, imaginando que isso irá prejudicar a economia do país e enfraquecer Franco. 
Justo apresenta a esposa, Manuela, para Magdalena. A filha, Paloma, pensará que há um romance entre o pai e a bela loira.  

Porém, como Justo esconde tudo isso da esposa e da filha, esta última pensa que a proximidade entre Justo e Magdalena se dá em função de algum romance entre eles, o que não acontece. E isso levará a um crescente conflito entre pai e filha. Esta última ficará sabendo da verdadeira história depois e a relação entre Justo e Paloma irá melhorar bastante. 


Além disso, as ações do grupo acabam chamando a atenção da polícia francesa, que deseja repatriar Justo para a Espanha. Manoela fica desesperada e tenta provar que Justo participou da Resistência e lutou na Guerra ao lado dos franceses. No fim, ela consegue provar isso e Justo permanece vivendo na França. 

Manoela descobre que Justo havia ficado preso no campo de Mauthausen e que o número dele no local era 5602, algo que ela já desconfiava desde o tempo em que vivia na Espanha. Na época, ela pesquisou a respeito do prisioneiro com este número, mas o nome do mesmo no documento era Antonio Modesto, que havia sido libertado em Junho de 1945 e que havia sido levado para um sanatório na Suíça.

No final, ele finalmente consegue contar para ela tudo o que passou no campo de refugiados francês (onde os Republicanos espanhóis foram muito mal tratados) e no campo de Mauthausen. Ele diz que gostaria de esquecer de tudo o que lhe aconteceu, menos dela.

Justo chora e a mulher que nunca o esqueceu e que o amou a vida inteira, Manuela, chora junto com ele.
Justo e o grupo de refugiados e membros da Resistência com quem ele lutou durante a Segunda Guerra Mundial. Depois do término desta, eles continuaram fazendo ações de sabotagem, tentando derrubar a Ditadura Franquista. Este é mais um fato histórico que é mostrado no filme, embora os personagens sejam ficcionais. 

E daí vemos a filha, Paloma, já crescida, casada com Pierre e com o seu filho (Justo Junior), o antigo amigo de seus pais e que também fazia parte do grupo de Resistentes. 


Obs4: Milhares de Republicanos participaram da Resistência francesa e algumas centenas se integraram ao Exército Vermelho da URSS. Estes últimos eram militantes ligados ao PCE (Partido Comunista Espanhol) que fugiram para a URSS após a derrota na Guerra Civil Espanhola. Assim, por exemplo, o filho de Dolores Ibárruri, a 'Pasionaria', morreu lutando na defesa de Stalingrado, em 1942.

Logo, mesmo sem ser uma obra-prima, 'A Mulher do Anarquista' acaba tendo a sua importância pelo fato de mostrar o que aconteceu aos Republicanos espanhóis no final da Guerra Civil e depois, já na condição de refugiados, durante a Segunda Guerra Mundial e durante a Ditadura Franquista (1939-1975). 


Obs5: É bom ressaltar que as forças franquistas nunca conseguiram conquistar militarmente a cidade de Madrid. O que aconteceu é que em Março de 1939 ocorreu um Golpe de Estado traiçoeiro, comandado pelo Coronel Segismundo Casado, que derrubou o governo legítimo da República, liderado pelo Primeiro-Ministro Juan Negrin. Este queria continuar lutando e resistindo, acreditando que quando estourasse uma guerra europeia entre Alemanha/Itália contra França/Grã-Bretanha, o cenário internacional se modificaria radicalmente. Com isso, as Democracias do Ocidente passariam a apoiar o governo Republicano. Mas a Guerra Civil Espanhola terminou no final de Março de 1939, enquanto que a guerra europeia estourou apenas em Setembro de 1939, quando a Alemanha Nazista invadiu a Polônia. 
Na praia onde Justo ficou preso no campo de refugiados, Manuela consola o homem que sempre amou e com quem passará todos os dias restantes de sua vida. É um final comovente e emocionante.
No Pasarán!

Informações Adicionais:

Título: La Mujer del Anarquista; 
Diretor: Marie Noelle e Peter Sehr; 
Roteiro: Marie Noelle e Ray Loriga;
Fotografia: Jean-François Robin; Música: Zacarias M. de la Riva; 
Gênero: Drama Político; Duração: 117 minutos;
Países de Produção: Espanha, Alemanha e França; Ano de Produção: 2008;
Elenco: María Valverde (Manuela); Juan Diego Botto (Justo Calderón); Ivana Baquero (Paloma adolescente, aos 15 anos); Nina Hoss (Magdalena Lenin); Jean-Marc Barr (Pierre); Laura Morante (Lucienne); Irene Montalà (Pilar); Adrià Collado (Francisco); Biel Duran (Luis); Irene Visedo (Paloma aos 35 anos); Toni Sevilla (Pedro Munoz); Luis Callejo (Jose María Munoz); Ainoa Ruiz (Paloma aos 11 anos). 
Prêmio: Melhor Filme no Festival de Munique (2008). 

Links:

A participação dos Republicanos espanhóis na Segunda Guerra Mundial e na Libertação de Paris:

https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/08/25/agosto-de-1944-os-anarquistas-que-libertaram-paris/
Soldados Republicanos espanhóis da 'La Nueve' entrando em Paris, quando ocorreu a libertação da cidade (em Agosto de 1944). O gesto do soldado mostra que ele era um Anarquista.

Paco Roca, consagrado autor de HQs, lançou uma história em quadrinhos que mostra a participação de Republicanos espanhóis na libertação de Paris:


http://www.tujaviu.com/2014/04/la-nueve-os-republicanos-espanhois-que-libertaram-paris-graphic-novel-espanhol-paco-roca-ganha-versao-em-frances.html

França condecora três Republicanos espanhóis que participaram da libertação de Paris:

https://www.terra.com.br/noticias/mundo/europa/franca-condecora-3-soldados-espanhois-que-libertaram-paris,35899ce682a0b310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html

O campo de concentração de Mauthausen:

http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/05/inaugurado-novo-memorial-no-campo-de-concentracao-de-mauthausen.html


Republicanos Espanhóis saudando a chegada das forças Aliadas que libertaram os prisioneiros no campo de concentração de Mauthausen. 

Vídeo - Trailer do filme 'La Mujer del Anarquista':


domingo, 24 de dezembro de 2017

'Los Girasoles Ciegos' mostra como funcionava a repressão contra os Republicanos na Ditadura Franquista! - Marcos Doniseti!

'Los Girasoles Ciegos' mostra como funcionava a repressão contra os Republicanos na Ditadura Franquista! - Marcos Doniseti!

Los Girasoles Ciegos! - A Ditadura Franquista!
'Los Girasoles Ciegos' é um filme espanhol que mostra que na repressão da Ditadura Franquista as pessoas não estavam seguras nem mesmo dentro de suas residências. 
Este é um bom filme sobre a repressão brutal promovida pela Ditadura de Franco (1939-1975), que implantou um Estado Policial, de características totalitárias, na Espanha durante muito mais tempo do que Hitler ou Mussolini fizeram na Alemanha e na Itália.

O papel fundamental da Igreja para que isso acontecesse também fica bastante evidente no filme, pois ela é que controlava a educação pública no país durante a Ditadura Franquista, bem como censurava a produção cultural e administrava inúmeras prisões e instituições correcionais.

No filme, vemos que os Republicanos (anarquistas, socialistas, comunistas...) continuaram sendo brutalmente perseguidos mesmo depois do fim da Guerra Civil.

Centenas de milhares de espanhóis foram perseguidos e mortos pela Ditadura Franquista, que foi a mais repressiva e violenta na Europa do Pós-Guerra. Para o ditador assassino e genocida espanhol, Francisco Franco, a Guerra continuou depois que os combates terminaram, em 01/04/1939. 
Salvador, o diácono que participou da Guerra Civil Espanhola, durante a qual se comportou de maneira não recomendável pela Igreja Católica, pecando em várias oportunidades: matando pessoas, tendo relações sexuais... 

Afinal, a Ditadura Franquista implantou um brutal esquema de vigilância, delação, perseguição e de repressão contra qualquer cidadão espanhol que tivesse simpatizado com a República (democrática, laica, secular, reformista), em especial com o governo da Frente Popular que havia sido eleito diretamente pelo povo em Fevereiro de 1936. 


Aliás, tal perseguição começou já no início da Guerra Civil, nos territórios conquistados pelos Franquistas, que promoviam estupros e massacres contra a população civil que defendia o governo Republicano da Frente Popular. Franco chegou a dizer, em uma entrevista, ainda em 1937, que se fosse necessário ele mataria metade da população espanhola.

Para ele, Franco, a Espanha precisava ser 'purificada,' eliminando-se do país aqueles elementos 'indesejáveis' (socialistas, comunistas, anarquistas, mulheres com espírito e atitude independente, homossexuais, etc).

Para atingir esse objetivo, a Ditadura Franquista também estimulava a delação dos 'Rojos' (Vermelhos, ou seja, socialistas, anarquistas ou comunistas) por parte da população espanhola.
Lorenzo, o filho mais jovem de Elena e Ricardo, durante uma aula, sendo questionado pela diácono Salvador, que era o seu professor. Durante a Ditadura Franquista, a Igreja Católica controlava a educação e a cultura na Espanha, além de administrar inúmeras prisões e institutos correcionais.
A Trama do Filme!

A trama do filme gira em torno de uma família cujo chefe (Ricardo) era um comunista perseguido pela Ditadura Franquista. Para evitar que o mesmo fosse preso e condenado à morte, a família (Elena, esposa, Elenita, a filha e Lorenzo, o filho mais novo) protege Ricardo, escondendo-o dentro da própria casa. Os membros da família dizem para todos que Ricardo morreu na guerra. 


Além disso, temos também a participação de Lalo, um jovem poeta comunista que namora a bela Elenita (que está grávida). Ele também é perseguido pela Ditadura Franquista. Os dois jovens decidem tentar fugir para Portugal, mas o destino deles será trágico. 

Todos os amigos e vizinhos sabiam que Ricardo era comunista e se as pessoas soubessem que ele estava vivo o mesmo seria delatado para a polícia franquista. Caso Ricardo fosse descoberto, ele seria acusado, julgado e condenado à morte, que era o destino reservado aos 'Rojos' (Vermelhos) espanhóis na Espanha Franquistas. 

Na Espanha Franquista, as pessoas morriam de medo de serem delatadas e uma ótima maneira de evitar isso era delatando outras pessoas, provando que eram ''bons espanhóis". A própria Ditadura estimulava a delação por parte da população, o que foi uma maneira de transformar as pessoas em cúmplices e colaboradoras do regime ditatorial. 
Na escola controlada pela Igreja Católica, os alunos eram obrigados a cantar um hino em louvor ao ditador Francisco Franco e a fazer a saudação fascista. 

E aqueles 'Rojos' que não eram fuzilados, acabavam trabalhando como escravos em inúmeras obras pelo país ou vegetavam e morriam nas prisões, nas quais ficavam por várias décadas, em péssimas condições de higiene e saúde, sequer tendo acesso a uma alimentação decente ou a assistência médica. 


E tudo estava indo bem, com a família conseguindo esconder dos outros a existência de Ricardo, até que um um jovem diácono (Salvador, simpatizante dos franquistas e que lutou na Guerra Civil) se apaixonou pela esposa (Elena) de Ricardo e começou a persegui-la pelas ruas da cidade e a visitar a casa da jovem mulher, que ele imagina ser uma viúva carente e solitária. Ele também procura conversar bastante com Lorenzo, a fim de tentar obter informações a respeito de Elena. 

E é justamente em função dessa paixão avassaladora que toma conta da alma do jovem diácono, Salvador, que Elena e Lorenzo passarão a ter dificuldades maiores para esconder a existência de Ricardo. A insistência de Salvador em ter um relacionamento amoroso com a 'viúva' Elena o levará a descobrir a verdade, o que resultará num final trágico para Ricardo e a família.
Elenita (filha de Ricardo e Elena) e Lalo (jovem poeta comunista perseguido pela Polícia Franquista) tentam fugir para Portugal, mas a sua tentativa irá fracassar, terminando de forma trágica. 

Salvador, posteriormente, tenta se justificar perante o seu superior a respeito do seu envolvimento amoroso com Elena e conta uma história que, essencialmente, é exatamente o contrário do que aconteceu, promovendo uma deliberada falsificação da história. Ele procura atribuir toda a culpa para a mulher, dizendo que a mesma tinha planejado tudo, sendo que, na verdade, ela fazia de tudo para evitar qualquer envolvimento com Salvador, pois amava de verdade ao seu marido, ao qual protegia. 


Aliás, foi exatamente isso que a Ditadura Franquista fez durante toda a sua existência, exaltando a figura de Franco, que teria salvo o país de 'comunistas asiáticos', bem como teria feito a Espanha se tornar 'Grande e Unida' novamente. 

Na verdade, o que Franco fez foi implantar o mais brutal regime de terror policial da Europa no Pós-Guerra, que contou com o total apoio das chamadas 'Democracias Liberais' do Ocidente (EUA, Grã-Bretanha, França), e que atrasou em décadas o processo de modernização do país (econômica, política, social, cultural). 
Elena é apaixonada pelo marido (Ricardo), um militante do PCE que é obrigado a viver escondido na própria casa, pois a Ditadura Franquista  estimulou as pessoas a delatarem os Republicanos. 

No filme fica bastante claro como o controle da educação pela Igreja Católica resultou na exaltação de Franco e no fortalecimento da sua brutal Ditadura. E também fica evidente que nem mesmo as residências dos espanhóis eram locais seguros, pois eles também eram alvos da repressão. 


E os espanhóis pagaram caro por isso, vivendo em um clima de 'paz de cemitérios' durante várias décadas em um dos países mais pobres e atrasados da Europa. 

Logo, a Ditadura Franquista jamais conseguiu atingir os seus objetivos, pois a 'União' do país foi alcançada por meio de um regime de Terror Policial e o país permaneceu na periferia do Velho Mundo. 

E após a morte de Franco (em Novembro de 1975), a Ditadura desmoronou rapidamente e a Espanha voltou a ser a mesma Democracia Liberal que era em 1936, antes que Franco e as forças reacionárias do país (Latifundiários, Exército, Igreja Católica, Monarquistas) promovessem um Golpe de Estado que desencadeou uma das mais brutais guerras civis do século XX, e na qual morreram cerca de 500 mil pessoas. 
O diácono Salvador se apaixona por Elena e passa a frequentar a casa dela, fato que o leva a descobrir que Ricardo estava vivo. 

Informações Adicionais:


Título: Los Girasoles Ciegos;
Diretor: José Luís Cuerda;
Roteiro: José Luis Cuerda e Rafael Azcona; Baseado no romance de Alberto Méndez; 
Fotografia: Hans Burmann; Música: Lucio Godoy;
Gênero: Drama Político;  Duração: 95 minutos;
País de Produção: Espanha; Ano de Produção: 2008;
Elenco: Maribel Verdú (Elena); Javier Câmara (Ricardo); Raúl Arévalo (Salvador); Roger Príncep (Lorenzo); Martín Rivas (Lalo); Irene Escolar (Elenita); José Ángel Egido (Reitor).
Prêmios:

Goya de (2009):
Melhor Diretor: José Luis Cuerda;
Melhor Roteiro Adaptado: (Rafael Azcona e José Luis Cuerda);
Melhor Ator: Raúl Arévalo;
Melhor Atriz: Maribel Verdú;
Melhor Ator Coadjuvante: José Ángel Egido;
Melhor Ator Revelação: Martiño Rivas;
Melhor Fotografia: Hans Burmann;
Melhor Montagem: Nacho Ruiz Capillas;
Melhor Direção Artística: Balter Gallart. 

Vídeo - Trailer do filme 'Los Girasoles Ciegos: