O contexto histórico!
Enrico Mattei foi o mais poderoso dirigente do maior conglomerado industrial e econômico da Itália no Pós-Guerra, que foi a ENI (Ente Nazionali Idrocarburi).
A ENI foi uma empresa estatal que foi criada em Fevereiro de 1953 a partir das ruínas da AGIP, que era uma empresa petrolífera (também estatal) que havia sido criada por Benito Mussolini em 1926 mas que, durante o regime fascista, fracassou na tentativa de encontrar gás natural ou petróleo no território italiano.
Porém, no Pós-Guerra, o governo conservador do PDC (Partido Democrata-Cristão) queria liquidar a AGIP, fechando a empresa, devido às pressões dos políticos liberais, que eram contrários à atuação do Estado na economia e que viam a AGIP como sendo uma 'herança fascista'.
Mas o visionário Enrico Mattei convenceu o governo italiano de que a AGIP não deveria ser liquidada, muito pelo contrário, mas fortalecida. E foi exatamente isso que ele fez depois que obteve do governo do país o apoio político necessário para expandir e desenvolver a AGIP/ENI.
Assim, Matttei desenvolveu uma estratégia de longo prazo que transformou a ENI em uma das mais poderosas empresas petrolíferas do mundo e que, depois, passou a controlar inúmeras outras empresas (também estatais), transformando-se em uma imensa e poderosa holding, que também atuava em muitos setores: petroquímica, geração de energia, navegação, gás, projetos e engenharia, construção, etc.
Porém, Mattei também adotou uma política de obrigar a que todas as empresas da holding fossem lucrativas e competitivas. Sua política de promover imensos investimentos no setor industrial e de infraestrutura contribuiu imensamente para o desenvolvimento industrial e econômico da Itália no Pós-Guerra.
Enrico Mattei levou adiante a política de fechar acordos com governos de países árabes e muçulmanos possuidores de petróleo (Líbia, Argélia, Tunísia, Egito, Nigéria, etc) e de fazer acordos que previam uma divisão de lucros que era muito favorável aos mesmos, pois os governos detentores das reservas petrolíferas ficavam com 75% dos lucros, enquanto que a ENI ficava com os outros 25%.
Enquanto isso, as 'Sete Irmãs' que dominavam o mercado petrolífero global sempre ofereciam acordos nos quais os lucros eram divididos pela metade, com as petroleiras ficando com 50% dos mesmos e os governos dos países produtores ficando com os outros 50%.
Essa postura de Enrico Mattei, de conceder 75% dos lucros aos governos dos países produtores, fez com que a ENI se expandisse rapidamente entre os países do então chamado 'Terceiro Mundo'.
Essa política adotada por Mattei também se beneficiou do processo de descolonização que ocorreu na África e na Ásia nas décadas de 1950 e 1960, que permitiu o surgimento de dezenas de novas nações independentes.
Os governantes destes novos países ambicionavam desenvolver economicamente seus países e melhorar as condições de vida de suas populações. E para isso estes governos dos países precisavam de recursos (capital, tecnologia, trabalhadores qualificados) que muitos deles não possuíam.
No entanto, essa rápida expansão da ENI pelo mundo em desenvolvimento (que, na época, era chamado de 'Terceiro Mundo') representava um claro desafio ao domínio do mercado mundial de petróleo pelas famosas 'Sete Irmãs', que eram (estou usando os nomes atuais): Shell (anglo-holandesa), British Petroleum (britânica); Exxon, Chevron, Mobil, Texaco e Gulf (estas cinco eram todas dos EUA). Estas empresas, somadas, controlavam 85% do mercado mundial de petróleo.
Desta maneira, EUA e Grã-Bretanha controlavam o mercado mundial de petróleo no Pós-Guerra, produto que era essencial (e que ainda é) para o desenvolvimento da economia capitalista globalizada. A ENI foi a empresa que desafiou esse domínio das 'Sete Irmãs', fato este que as deixou, no mínimo, profundamente irritadas.
E o responsável por isso foi Enrico Mattei, que acabou pagando com a própria vida por essa ousadia, sendo assassinado em 1962, quando o avião em que viajava de Catania (na Sicília) rumo a Milão acabou sendo sabotado, levando a queda do mesmo antes de aterrissar na pista do aeroporto da cidade.
Além disso, Enrico Mattei também fez a ENI assinar acordos petrolíferos com a União Soviética, o que gerou fortes críticas do governos dos EUA, pois ainda estávamos vivendo a época da Guerra Fria. Não se pode esquecer, por exemplo, que o ano do assassinato de Enrico Mattei, que foi 1962, também foi aquele em que tivemos a famosa 'Crise dos Mísseis', em Cuba, que quase levou o mundo a uma devastadora guerra nuclear entre EUA e URSS.
O fantástico ator Gian Maria Volonté interpreta Enrico Mattei. Nesta cena, ele esconde da esposa uma carta que continha ameaças de morte. |
Este corajoso filme de Francesco Rosi (diretor de ideias socialistas, mas que nunca foi filiado a nenhum partido, embora fosse próximo do PCI), realizado em 1972, usa de um livro escrito na época para denunciar este crime. O livro se chama "L'Assassinio di Enrico Mattei".
Obs1: Os autores do livro usado por Francesco Rosi para realizar o seu belo filme são Fúlvio Bellini e Alessandro Previdi. Bellini foi um partigiano (guerrilheiro) que lutou contra o nazifascismo e no Pós-Guerra ele se tornou um autor voltado para temas da história italiana, escrevendo livros sobre a história do PCI (Partido Comunista Italiano), a respeito da queda do regime Fascista de Mussolini em Julho de 1943 e também sobre o sequestro e morte de Aldo Moro pelas 'Brigadas Vermelhas' em 1978. Previdi também foi um Partigiano e no Pós-Guerra ele se tornou jornalista, trabalhando em importantes jornais italianos.
É bom que se diga que embora milhões de italianos, durante muitos anos, afirmassem que Mattei tinha sido assassinado, somente em 1997 é que a Procuradoria da cidade de Pavia (norte da Itália) comprovou o fato de que isso havia acontecido. Nas investigações realizadas foi realizada uma autópsia nos ossos do corpo de Mattei e descobriu-se a presença de traços de explosivos nos mesmos.
Também foi provado que o agricultor que, na época afirmou que tinha visto o avião explodir em pleno ar (antes de atingir o solo, portanto) mudou, posteriormente, a sua versão quando prestou depoimento para a Justiça.
Aliás, todas essas informações, que foram comprovadas em 1997, já apareciam neste corajoso filme dirigido por Francesco Rosi em 1972 e que, inclusive, participa do filme como diretor e personagem do mesmo.
Enrico Mattei fazia bom uso da Mídia para divulgar as suas realizações. |
O Cinema Político Italiano!
Durante as décadas de 1960 e 1970 foram produzidos na Itália inúmeros filmes que procuravam retratar a realidade política e social do país. E para entender isso é necessário compreender o que aconteceu no país neste período.
Os primeiros anos da década de 1960 foram marcados pelo 'Boom' econômico, pela retomada das greves operárias e pelo início da participação do Partido Socialista Italiano no governo do país, que começou em 1963.
Mas o período que foi o mais conturbado politicamente foi aquele que tivemos entre os anos de 1968 e 1981. Em 1968 tivemos a emergência de um forte e organizado movimento estudantil que, tal como ocorreu na França, realizou inúmeras manifestações.
Nos anos seguintes as lutas dos estudantes e de segmentos da classe operária e da intelectualidade italianas resultaram na criação de inúmeros movimentos de Extrema-Esquerda, tais como o 'Prima Linea', as 'Brigate Rosse' (Brigadas Vermelhas) e o 'Lotta Continua'. Este último chegou a ter cerca de 20 mil militantes,
sendo bastante atuante.
Destes movimentos de Extrema-Esquerda o mais famoso foram as 'Brigadas Vermelhas', que foram as responsáveis pelo sequestro e morte de Aldo Moro (um dos líderes principais do Partido Democrata-Cristão) em Abril de 1978.
A polícia vai até o local do acidente conversar com as pessoas a respeito das circunstâncias da queda do avião em que Mattei estava. |
Esta foi uma época em que a Itália foi palco de inúmeros conflitos políticos e sociais que eram travados entre forças extremistas, de Direita e de Esquerda, nas ruas das principais cidades italianas. Tais grupos extremistas usaram de muita violência, promovendo inúmeros atentados terroristas e assassinatos de inimigos políticos e ideológicos. Até mesmo jornalistas, editores e juízes eram vítimas dessa violência.
Estes anos entraram para a história italiana com o nome de 'Anni di Piombo' (Anos de Chumbo), período no qual morreram cerca de 2 mil pessoas, que foram vítimas da violência política do período.
O ponto de partida para essa onda de violência política foi o famoso atentado que ocorreu em uma agência bancária na Piazza Fontana (Praça Fontana), no dia 12/12/1969, em Milão, e que foi realizado pela Extrema-Direita. Esse atentado brutal resultou na morte de 17 pessoas. Outras 88 ficaram feridas. Além disso, ocorreram também alguns atentados, de menor porte, em Roma.
Na época, as investigações sobre o atentado de Milão foram manipuladas no sentido de se tentar culpar um grupo da Esquerda Anarquista como o responsável pelo atentado, mas posteriormente descobriu-se que foram grupos de Extrema-Direita, que envolviam Militares, Serviço Secreto, políticos direitistas, Neofascistas e a Máfia.
Tais atentados perpetrados pela Extrema-Direita faziam parte da chamada 'Estratégia de Tensão', que visava promover um processo de radicalização política e ideológica a fim de justificar um Golpe de Estado que implantasse uma Ditadura Militar na Itália.
Tal estratégia já havia sido usada na Grécia, o que resultou em um Golpe de Estado
em 1967.
A intenção desses grupos extremistas de Direita era culpar os grupos de Extrema-Esquerda pelos atentados em Milão e Roma, usando os mesmos para levar o Golpe de Estado adiante, mas o plano acabou fracassando. Aliás, qualquer semelhança com outros Golpes semelhantes na história não é mera coincidência. Exemplo disso foi incêndio do Reichstag alemão, em 27/02/1933, que foi usado por Hitler como justificativa para implantar a Ditadura na Alemanha, dizendo que o mesmo fazia parte de um 'Golpe de Estado Comunista', o que era uma deslavada mentira.
Obs2: O cineasta italiano Marco Tullio Giordana dirigiu um excelente filme a respeito da história do atentado na Piazza Fontana e que se chama 'Romanzo di una Strage'.
A Itália já possuía uma bela história de produzir filmes que retratassem a realidade do país e do seu povo desde a época do Neorrealismo, que se desenvolveu a partir de 1943, com a realização do filme 'Ossessione', de Luchino Visconti, e que se consolidou com o grande sucesso alcançado por 'Roma Città Aperta', de Roberto Rossellini, de 1945. 'Ladrões de Bicicleta', (1948) de Vittorio De Sica, foi outra produção neorrealista que obteve grande sucesso, chegando até a conquistar o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 1950 e o Globo de Ouro do mesmo ano.
Aliás, isso ajuda a explicar porque vários dos principais cineastas italianos que realizaram os filmes do ciclo do 'Cinema Político' tiveram a sua formação na época do Neorrealismo, o que foram os casos de Francesco Maselli, Elio Petri e de Francesco Rosi (diretor deste 'Il Caso Mattei'), por exemplo. Eles trabalharam com vários dos principais diretores ligados ao Neorrealismo.
Operários italianos olham para o gás que é extraído do Vale do Rio Pó. Com a descoberta a região inicia um longo período de crescimento econômico. |
Assim, Francesco Rosi trabalhou com Luchino Visconti, Michelangelo Antonioni, Luigi Zampa e Luciano Emmer, seja na condição de roteirista ou como assistente de direção.
Entre os inúmeros filmes da época do ciclo do 'Cinema Político Italiano', nós tivemos:
- Os Delfins (Francesco Maselli; 1960);
- O Assassino (Elio Petri; 1961);
- Aquele que Sabe Viver (Dino Risi; 1962);
- As Mãos sobre a Cidade (Francesco Rosi; 1963);
- O Boom (Vittorio De Sica; 1963);
- Antes da Revolução (Bernardo Bertolucci; 1964);
- De Punhos Cerrados (Marco Bellocchio; 1965);
- Enquanto Durou o Nosso Amor (Florestano Vancini; 1966);
- Os Subversivos (Paolo e Vittorio Taviani; 1967);
- Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita (Elio Petri; 1970);
- A Classe Operária vai ao Paraíso (Elio Petri; 1971);
- Mimi, o metalúrgico (Lina Wertmuller; 1972);
- O Monstro na Primeira Página (Marco Bellocchio; 1972);
- Golpe de Estado à Italiana (Mario Monicelli; 1973);
- Nós que nos amávamos Tanto (Mario Monicelli; 1974);
- Cadáveres llustres (Francesco Rosi; 1976);
- Eu Tenho Medo (Damiano Damiani; 1977).
Enrico Mattei sempre recebia muito bem os jornalistas a fim de divulgar as suas realizações à frente da AGIP/ENI. |
A trama do filme!
A história do filme já foi resumida aqui e a mesma trata do assassinato de Enrico Mattei por meio de um atentado terrorista que derrubou o avião no qual ele viajava. Mattei vivia sofrendo ameaças de morte e foi alertado de que o seu avião poderia ser sabotado, mas dizia que se realmente desejassem a sua morte, então não haveria como impedir que isso acontecesse.
Mattei era o dirigente da principal holding empresarial italiana (a ENI), de caráter estatal, que era a maior investidora da Itália, atuando em inúmeros setores produtivos. O mais importante setor em que a ENI atuava era o de petróleo.
O filme de Francesco Rosi começa mostrando o local em que ocorreu a queda do avião em que Mattei viajava, um pouco antes de chegar ao aeroporto de Milão (ele caiu nas proximidades de Pavia). Mattei vinha da Sicília e o filme de Rosi mostra que o avião em que o dirigente da ENI viajou foi sabotado, de maneira a que explodisse em pleno ar quando começasse a se preparar para fazer a aterrissagem.
Durante o filme vemos a Polícia interrogando os moradores da região em que o avião explodiu, o que resultou na morte de Mattei, de um jornalista da revista 'Time' e do piloto. Durante os interrogatórios realizados no local do atentado um camponês chegou a declarar que tinha visto o avião que levava Mattei explodir em pleno ar, deixando claro que havia ocorrido um atentado terrorista.
Mas, posteriormente, o mesmo camponês, quando prestou depoimento para a Justiça, apresentou uma versão diferente, dizendo que não tinha visto explosão alguma. Então, o filme de Mattei deixa aberta a possibilidade que o camponês teria sido ameaçado.
Inclusive, quando a Justiça italiana comprovou (em 1997) que Mattei tinha morrido em um atentado terrorista a Procuradoria de Pavia (local onde o avião explodiu), que havia reaberto o caso, anunciou que iria processar o agricultor pelo fato dele ter modificado o seu depoimento, o que impediu que fosse comprovado que Mattei havia sido assassinado.
O filme mistura vários momentos históricos, começando já com a morte de Mattei e depois conta a história de como ele se tornou o presidente da AGIP e, mais adiante, da ENI e, mais tarde, como ele enfrentou, sem medo, o imenso poder das 'Sete Irmãs'.
Rosi mostra que Mattei teve que lutar intensamente, desde o início, para conseguir provar que a AGIP (e a futura ENI) era uma empresa viável e que valia a pena manter a mesma funcionando. Ele usa, inclusive, de depoimentos verdadeiros de dirigentes italianos da época de Mattei e o próprio Rosi chega a participar do filme, como alguém que está investigando a morte de Mattei.
Obs3: Aliás, ao pedir que um jornalista originário da Sicília (Mauro de Mauro, do jornal siciliano "L'Ora", que era próximo do PCI) investigasse, em Setembro de 1970, as circunstâncias da morte de Mattei, o mesmo acabou sendo assassinado, o que mostra que o caso do assassinato de Mattei, mesmo depois de tanto tempo (o filme é de 1972), ainda era um tema tabu e bastante perigoso para se mexer. O jornal "L'Ora" sempre foi conhecido por combater e denunciar os crimes da Máfia e sofreu vários ataques da organização.
No filme, Francesco Rosi promove um debate entre Enrico Mattei e um jornalista liberal, que se opunha à sua política de promover grandes investimentos produtivos por meio da ENI. |
Mas para que isso acontecesse ele sabia que era necessário encontrar alguma fonte de riqueza que a AGIP pudesse explorar e que gerasse lucros e benefícios para a economia italiana. E foi assim que o persistente Mattei encontrou entre inúmeros documentos da empresa a comprovação de que isso seria possível. Ele leu relatórios elaborados por técnicos da empresa que diziam existir petróleo e gás natural no Vale do Rio Pó (norte da Itália).
Mattei procura pelo engenheiro da AGIP que comandou a prospecção (engenheiro Ferrari) e que havia sido demitido junto com outros técnicos tempos antes, quando o governo italiano ainda demonstrava intensão de fechar a empresa. Mattei o encontra em Milão (em frente à Catedral da Cidade, na 'Piazza del Duomo' ou 'Praza da Catedral') e o questiona sobre a viabilidade daqueles estudos.
Ferrari explica que os estudos foram elaborados de maneira rigorosa e, assim, Mattei decide viajar com ele até a região em que haviam sido encontrados indícios da existência de gás natural e petróleo.
Mattei e Ferrari encontram uma região desolada, com os trabalhadores que antigamente eram empregados da AGIP estando inativos, desempregados, que passavam o tempo jogando cartas em um barracão. Ferrari afirma que a jazida de gás natural é enorme e, depois de comprovar a existência das mesmas, Mattei recontrata o técnico e os trabalhadores que haviam sido demitidos.
Com a descoberta de grandes reservas de gás, Mattei conseguirá um empréstimo bancário e unindo tais recursos com o apoio de importantes lideranças políticas do governo do Partido Democrata-Cristão ele consegue levar adiante o seu projeto de manter a AGIP funcionando. Em 1953 ele irá transformar a mesma AGIP na ENI, que se tornará uma das maiores holdings da Europa no Pós-Guerra, atuando em vários setores da economia italiana.
E graças à descoberta do gás, que era explorado apenas pela AGIP (e pela futura ENI) a industrialização do norte da Itália passou a contar com uma importante fonte de energia, visto que a Itália sempre sofreu muito para se desenvolver a sua indústria e a sua economia justamente pelo fato de ser um país pobre em recursos naturais.
Para defender a ENI e poder enfrentar os interesses das chamadas 'Sete Irmãs', Mattei contava sempre a história de um gatinho, débil e fraco (que simbolizava a ENI), que queria se alimentar, mas que era impedido pelas 'Setes Irmãs' (representadas por cães raivosos).
O filme clássico de Rosi também mostra que Mattei era muito habilidoso no seu relacionamento com a imprensa, procurando usar a mesma para fazer uma ampla publicidade das realizações da AGIP/ENI. E mesmo quando os jornalistas criticavam a sua atuação e da empresa ele procurava conversar com os mesmos a fim de prestar esclarecimentos e informações.
Mattei levou o jornalista que o contestava até a Tunísia para ver pessoalmente os investimentos que eram feitos pela ENI no país africano. |
Assim, temos no filme um jornalista (sem nome) que representa esse segmento da imprensa, defensora do Liberalismo econômico, e que era extremamente crítico com a atuação da ENI e acusava a empresa de usar verbas secretas e de excesso de intervenção na economia. Mattei diz, claramente, para o jornalista que o mesmo está defendendo tais interesses privados e não os da Itália. A ENI, diz Mattei, gera trabalho para 50 mil pessoas altamente qualificadas.
Assim, em vez de arrumar confusão publicamente com esse jornalista, Mattei o convida para acompanhar como era a sua rotina de trabalho, levando-o até a visitar uma plataforma de petróleo da ENI, bem como os países árabes (Líbia, Argélia, Tunísia), com os quais a ENI havia assinado inúmeros contratos de produção (baseado na divisão 75%/25%).
Estes países haviam descoberto grandes reservas de petróleo, mas não possuíam o capital, a tecnologia e nem os trabalhadores qualificados para fazer o trabalho de pesquisa e extração do petróleo. A ENI fornecia tudo isso. Desta maneira, a ENI irá ocupar um importante espaço no mercado petrolífero global que, antigamente, era exclusivo das 'Sete Irmãs', o que irá deixar as mesmas profundamente irritadas.
Esse conflito com essas empresas, que atuavam como um gigantesco Cartel Privado, dividindo o controle do petróleo no mundo entre elas, é representado no filme por um diretor de uma destas empresas (é um personagem alto, cabelos brancos, pele extremamente clara e corpulento) e que não aceita nenhuma das ideias e políticas de Enrico Mattei.
Gian Maria Volonté tem mais uma excelente atuação neste filme clássico do 'Cinema Político Italiano'. Nesta cena, Mattei é recebido com festa pelo povo da Sicília. |
Desta maneira, Mattei acaba desenvolvendo uma política externa própria, que leva em consideração os interesses italianos, o que faz com que a ENI assine até mesmo contratos de compra de petróleo soviético, para profunda irritação dos EUA.
Com esse imenso crescimento da ENI, dentro da própria Itália o engenheiro Enrico Mattei se torna uma importante liderança econômica e também política e é requisitado até mesmo para usar a empresa a fim de salvar empresas que estão correndo o risco de quebrar, gerando aumento do desemprego.
E quando a ENI encontra reservas de gás natural na Sicília ele foi recebido na ilha como se fosse o verdadeiro governante da Itália, com festas públicas, passeatas, com a presença de milhares de pessoas e reuniões e jantares com as figuras mais poderosas da ilha.
Embora o filme não diga exatamente quem teriam sido os responsáveis pela morte de Enrico Mattei, no mesmo é sugerido que tivemos participação do Serviço Secreto francês e da Máfia.
Em 1997, como já afirmei, finalmente foi comprovado, pela Justiça italiana, que essa versão que o filme apresenta para a morte de Enrico Mattei é verdadeira. Porém, até agora não se sabe quem foram os responsáveis pelo atentado que o vitimou.
Informações Adicionais!
Título: Il Caso Mattei (O Caso Mattei);
Diretor: Francesco Rosi;
Roteiro: Francesco Rosi e Tonino Guerra; Baseado no livro "L'Assassinio di Enrico Mattei", de autoria de Fúlvio Bellini e Alessandro Previdi;
Ano de Produção: 1972;
País de Produção: Itália;
Gênero: Drama Político;
Duração: 110 minutos;
Música: Piero Piccioni;
Fotografia: Pasqualino De Santis;
Elenco: Gian Maria Volonté (Enrico Mattei);
Prêmios: Melhor Filme - Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1972.
Globo de Ouro (Itália) - Melhor Filme em 1973.
Links:
Itália admite que Enrico Mattei morreu em um atentado terrorista:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1997/11/22/mundo/9.html
Enrico Mattei, a AGIP e as Sete Irmãs:
https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Cinema/Petrobras-um-filme-a-ser-revisto/59/32548
A história da ENI e seus conflitos com as 'Sete Irmãs':
https://jornalggn.com.br/historia/a-italia-contra-as-sete-irmas-do-petroleo-por-andre-araujo/
https://jornalggn.com.br/historia/eni-a-petroleira-italiana-da-guerra-fria/
Informações sobre o filme:
https://www.imdb.com/title/tt0068346/?ref_=ttfc_fc_tt
História do livro que deu origem ao filme:
http://www.archiviostorico.info/Rubriche/Librieriviste/recensioni4/assassinioEnricoMattei.htm