Baecque mostra que os cinéfilos não apenas assistiam aos filmes, mas debatiam intensamente sobre os mesmos e escreviam críticas. Todas estas atividades destes apaixonados pelo Cinema irão resultar na criação de inúmeras publicações ('Cahiers', 'Positif'...) e, depois, estes cinéfilos começaram a fazer filmes, o que vai resultar na criação da Nouvelle Vague.
Nesta época, a opinião dos críticos era levada em consideração pelo público e se um filme fosse mal avaliado pela crítica isso afetava fortemente as bilheterias dos filmes.
É bom ressaltar que a própria Nouvelle Vague, no início, dividiu as opiniões, pois ela era fortemente atacada pelos críticos mais tradicionalistas, defensores do cinema de 'tradição de qualidade' existente no país, a qual os críticos chamados de 'Jovens Turcos' da Cahiers du Cinema (Truffaut, Chabrol, Rivette, Rohmer e Godard) queriam fazer picadinho.
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Jean Rouch, Chabrol (segurando a placa) e Godard lideram manifestação defendendo o retorno de Henri Langlois ao comando da Cinemateca Francesa, que foi criada por ele em 1936. |
O cinema francês dos anos 1950 (chamado de 'tradição de qualidade') era caracterizado pelo conservadorismo e pela padronização, ou seja, faziam-se sempre filmes com temas muito semelhantes, que eram dirigidos sempre pelos mesmos diretores, que eram escritos sempre pelos mesmos roteiristas e com os mesmos intérpretes.
Truffaut, quando atuou como crítico (brilhante) do 'Cahiers du Cinéma', na década de 1950, criticou duramente ao cinema francês do período, que via em situação de estagnação criativa, liderando uma verdadeira batalha contra o mesmo, o que fazia com o total apoio dos outros críticos, chamados de 'Jovens Turcos', da 'Cahiers', incluindo Godard, Chabrol, Rivette e Rohmer.
Em seu livro, Baecque analisa a trajetória da Cinefilia francesa de 1944 até 1968, quando tivemos a chamada 'Batalha da Cinemateca', que foi resultado da demissão de Henri Langlois da direção da Cinemateca de Paris pelo governo de Charles De Gaulle (mas a decisão de demitir Langlois foi do ministro da Cultura, André Malraux).
A demissão de Langlois gerou uma forte reação dos cineastas e dos profissionais de Cinema franceses, que o viam como uma figura essencial para a sua formação cinematográfica.
Afinal, a Cinemateca havia sido criada por Langlois ainda antes da Segunda Guerra Mundial e seu trabalho à frente da mesma foi fundamental para a formação dos cinéfilos e de muitos cineastas franceses, principalmente aqueles ligados à Nouvelle Vague.
Não foi à toa, portanto, que Truffaut, Godard, Rivette, Jean Rouch e Jean-Pierre Léaud, entre outros, estivessem à frente do movimento, que acabou sendo vitorioso, para que Langlois fosse reconduzido ao comando da Cinemateca.
Tal movimento mobilizou cineastas consagrados do mundo inteiro (Hitchcock, Rossellini, Kurosawa, etc), sendo que muitos chegaram a proibir a exibição dos seus filmes na Cinemateca enquanto Langlois não voltasse ao comando da instituição que ele mesmo criou.
E a 'Batalha da Cinemateca', que ocorreu entre Fevereiro e Abril de 1968 acabou antecipando em três meses a rebelião que tivemos durante o famoso Maio de 68, acabou sendo o ponto final desta história da Cinefilia francesa que Baecque conta neste livro fantástico.
Portanto, o livro de Baecque é uma leitura imprescindível para quem deseja conhecer a história da cinefilia, da atividade crítica e do próprio cinema francês no Pós-Guerra.
Obs: Temos vários filmes que estão, de alguma maneira, relacionados ao assunto do livro de Baecque (a cinefilia, é claro), como 'Os Sonhadores', de Bernardo Bertolucci, 'Beijos Proibidos', de François Truffaut e "Les Sièges d'Alcazar" (1989), de Luc Moullet.
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Henri Langlois: Para o crítico Serge Toubiana, sem o trabalho de Langlois na Cinemateca a Nouvelle Vague jamais teria existido. |