terça-feira, 4 de abril de 2023

'Fringe' - 'O Fim da Eternidade', de Isaac Asimov, ajuda a explicar de que maneira os Observadores foram apagados!

'Fringe' - O Fim da Eternidade', de Isaac Asimov, ajuda a explicar de que maneira os Observadores foram apagados!

Walter, Olívia, Peter, Donald (ex-September) e Michael, o personagem central para se resolver os dilemas do final da série.

Em um texto anterior, publicado em um grupo no Facebook, no qual comentei de que maneira o Tempo foi reiniciado na 5a. temporada e, com isso, os Observadores deixaram de existir, inviabilizando a invasão na nova Timeline (Redefinida), escrevi o seguinte:

"Tudo o que aconteceu ATÉ A SEQUÊNCIA DO PARQUE, nas duas Timelines (Reescrita e na Redefinida), é exatamente igual. Os acontecimentos, até aquele momento, são os mesmos nas duas Timelines. Então, isso significa que os Observadores foram apagados da Timeline Redefinida no exato momento que antecede ao início da invasão. E foi por isso que a invasão não aconteceu na Timeline Redefinida.".

Algumas pessoas poderiam questionar: Como seria possível apagar os Observadores, na nova Timeline (a Redefinida), apenas na sequência do parque, um pouco antes da invasão começar? E de que maneira os acontecimentos anteriores a este fato permaneceriam os mesmos da Timeline anterior (a Reescrita)?

Bem, para entender melhor esse assunto, eu indico a leitura do livro 'O Fim da Eternidade', de Isaac Asimov, um dos mais importantes escritores de Ficção Científica da história.

Em 'O Fim da Eternidade', Asimov mostra que os chamados 'Eternos' (que seriam o equivalente, em 'Fringe', ao chefe do Windmark) tem o poder de mudar um determinado aspecto da realidade em um momento específico, sem que seja necessário recomeçar tudo e iniciar uma nova Timeline.

Então, isso é o que poderia ter acontecido em 'Fringe'. Mas quem teria o poder de fazer isso em 'Fringe'? O Michael, é claro. O Michael é quem teria esse poder.

'O Fim da Eternidade', livro de Isaac Asimov, influenciou a última temporada de 'Fringe'.

Afinal, não podemos esquecer que nem mesmo o Windmark e seus Observadores do século 27 conseguiram sequer descobrir o que o Michael é. Eles não conseguiram sequer descobrir qual é o seu nível de inteligência e quais são os poderes que ele possui.

O próprio September falou que o Michael era muito mais evoluído do que todos os outros Observadores, o que esses constataram quando o submeteram a vários testes. 

E esses poderes do Michael eram crescentes, aumentando cada vez mais. Para se constatar isso, basta comparar o Michael de 2015, da 5a. temporada, com aquele que vimos no início da série, na 1a. temporada. Seus poderes eram muito maiores quando o vimos novamente na série.

E no futuro, em 2167, para onde ele foi junto com o Walter, o Michael pode muito bem ter sido o responsável por promover a mudança de realidade em um momento específico, a sequência do parque, antes da invasão começar.

Portanto, é perfeitamente válida a ideia de que alguém tão poderoso como o Michael possa ter sido o responsável pelo apagamento dos Observadores, na Timeline Redefinida, em um momento específico, um pouco antes da invasão começar e sem que fosse necessário apagar os acontecimentos anteriores dessa Linha Temporal.

'Fringe' - Trailer da 5a. Temporada:



domingo, 24 de abril de 2022

The Thin White Duke – o alter-ego fascista de David Bowie!

The Thin White Duke – o alter-ego fascista de David Bowie!

David Bowie na fase do 'The Thin White Duke' (O Mago Duque Branco), uma das mais criativas e polêmicas da sua genial trajetória.

Escrito em 13 de agosto de 2019, por Alex Wood, no St Andrews Radio 

Alter-egos são sinônimos de David Bowie.

Seja falando do renomado Ziggy Stardust, Halloween Jack ou Aladdin Sane, a performance teatral de Bowie deu uma personalidade a cada álbum que ele fez. Mas em janeiro de 1976, com o lançamento de Station to Station, ele assumiu seu papel final do Thin White Duke.

Na contracapa de seus álbuns de sucesso Diamond Dogs (1974) e Young Americans (1975), Bowie se estabeleceu em Los Angeles. Ele alegou na época ter se aposentado do rock and roll para poder se concentrar em ser o que sempre aspirou: uma estrela de cinema.

Ele teve a oportunidade de Nicolas Roeg para estrelar o filme britânico de ficção científica The Man Who Fell to Earth (1976). O filme se concentra em um alienígena humanoide, chamado Thomas Jerome Newton (interpretado por Bowie), que está determinado a encontrar uma fonte de água para seu planeta alienígena que enfrenta a seca.

Para explorar esse papel, Bowie teve que ficar sem emoção, embora Roeg o tenha avisado que interpretar o papel de Newton seria difícil de se livrar. Sua previsão foi assustadoramente precisa.

David Bowie no papel do alienígena Thomas Jerome Newton no filme 'The Man Who Fell To Earth' (1976), dirigido pelo cineasta britânico Nicolas Roeg, que foi baseado no livro do escritor Walter Tevis. Foto da revista 'Far Out'.

Durante as filmagens, no tempo de inatividade, Bowie decidiu escrever um livro de memórias intitulado The Return of the Thin White Duke, que ele usaria como preparação para seu próximo alter-ego.

Embora o livro tenha permanecido apenas em forma de manuscrito e nunca tenha sido encaminhado a uma editora, a influência de sua contraparte amoral (Newton) pode ser vista.

Identificado pelo cabelo loiro penteado e liso com um guarda-roupa de cabaré, sua aparência simples, mas afiada, era fortemente baseada em garotos-propaganda nazistas. Mais tarde, ele descreveu a persona como “Um tipo muito ariano e fascista; um pretenso romântico sem absolutamente nenhuma emoção”.

Bowie não parou apenas para ficar assim, mas queria encarnar completamente o papel. Em uma entrevista na época, ele disse que Hitler era “uma das primeiras estrelas do rock… tão bom quanto Jagger”.

Em uma entrevista diferente com a NME em 1975, ele também disse: “Você tem que ter uma frente de extrema direita chegando e varrendo tudo e arrumando tudo”. A extensão de sua interpretação de papéis havia borrado as linhas entre performance e realidade, questionando seus motivos para tais comentários.

No entanto, quando solicitado a lembrar o tempo de gravação de Station to Station, ele mais tarde afirmou que não tinha memória de todo o ano de 1975, devido ao abuso “astronômico” de cocaína. Mais tarde, ele também confirmou que estava vivendo apenas com uma dieta de pimentão vermelho, cocaína e leite durante sua estadia em Los Angeles.

Surgiram histórias de Bowie perdendo a sanidade quando artigos escreveram sobre ele vendo corpos caindo pela janela, queimando velas pretas em sua casa enquanto se cercava de artefatos egípcios antigos e até alegava ter seu sêmen roubado por bruxas.

No final do ano, Bowie tinha 1,70m de altura, pesava menos de 45 kg e praticamente nunca dormia. Ele chamou o período de 1974-1977 de “anos mais sombrios de sua vida” devido ao uso excessivo de drogas e temeu pela perda de sua sanidade.

David Bowie na fase do The Thin White Duke.

Mas em 1977, quando ele terminou a turnê de seis meses do álbum, ele abandonou o papel junto com seu vício em drogas e se mudou para a Europa para se juntar a Iggy Pop em Berlim, estimulando sua famosa Trilogia de Berlim.

Bowie nunca mais voltaria a interpretar papéis depois de sua experiência com o Thin White Duke. Ele havia levado sua sanidade ao limite sem retorno e não estaria preparado para empurrá-la novamente.

O lançamento de Station to Station o viu chegar ao Top 5 nos EUA e no Reino Unido, além de ser amplamente considerado um de seus melhores álbuns.

Enquanto muitos LPs movidos a cocaína muitas vezes viram artistas ficarem aquém da marca (Oasis 'Be Here Now' imediatamente vem à mente), Bowie não deixou que isso o impedisse. Este é o exemplo perfeito de quão longe ele estava disposto a ir para alcançar a grandeza e como ele quase enlouqueceu ao fazê-lo. No entanto, no final, valeu a pena espetacularmente para o homem que caiu da terra.

Comentário:

Phil Andrews em 28/07/2020

Um resumo excelente, embora conciso, do trabalho de Bowie durante o período. Se sua adição de cocaína realmente alimentou sua criatividade durante a produção deste álbum ou se seu profissionalismo simplesmente não permitiu que isso atrapalhasse, é um ponto discutível. Seja qual for o caso, eu diria que este era Bowie no topo absoluto de seu jogo.

Links: 

Texto de Alex Wood:

https://standrewsradio.com/the-thin-white-duke-david-bowies-fascist-alter-ego/

Trailer do filme 'The Man Who Fell to Earth':

https://www.youtube.com/watch?v=KarWCgIw3Wk

Show da turnê 'The Thin White Duke':

https://www.youtube.com/watch?v=BqCIeFRcMaU

'Changes', ao vivo, durante a 'The Thin White Duke Tour':


 

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Pandemia de Coronavírus: Será que 'Arquivo X' acertou em cheio (episódio 'F. Emasculata' e um vírus mortal)?

Pandemia de Coronavírus: Será que 'Arquivo X' acertou em cheio (episódio 'F. Emasculata' e um vírus mortal)? - Marcos Doniseti!
Episódio 'F. Emasculata' (02X22): Mulder e Scully vão até uma prisão federal na qual inúmeros prisioneiros estão morrendo em função da disseminação de um vírus mortal e desconhecido. Eles descobrem que tudo não passou de um experimento secreto feito por uma grande empresa farmacêutica e que o mesmo conta com a aprovação e proteção do governo.

Coronavírus: Uma Pandemia planejada?

Algumas pessoas dizem, de forma especulativa, que o vírus Covid-19 pode ter sido criado em laboratório.

Pepe Escobar, importante analista geopolítico, é um dos que trabalha com essa hipótese, mas sem afirmar isso de forma definitiva.

As forças da Direita e da Extrema-Direita global dizem que a pandemia do Coronavírus faz parte de uma conspiração do governo chinês para derrubar a economia do Ocidente e transformar a China na maior potência mundial, superando os EUA. Trump, durante um bom período de tempo, referiu-se ao Covid-19 como sendo o 'Vírus Chinês' e o secretário de Estado do seu governo (Mike Pompeo) o chamou de 'Vírus de Wuhan'. 

Enquanto isso, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês acusou os EUA como sendo possíveis responsáveis por disseminar o vírus Covid-19 na China, na época da realização dos 'Jogos Militares Mundiais', que ocorreram em Outubro de 2019, em Wuhan, uma cidade de 11 milhões de habitantes e que é capital da província chinesa de Hubei, que foi onde a pandemia começou. 

Assim, alguns dos militares enviados pelos EUA para participar dos Jogos estariam contaminados pelo Covid-19 e teriam sido os responsáveis por disseminar o mesmo na região.

A pandemia de Coronavírus começou na província de Hubei, mas existem várias teorias de conspiração a respeito de qual foi a origem do vírus. O fato é que a China conseguiu, em dois meses, controlar a pandemia, reduzindo rapidamente o número de casos, mostrando a capacidade do país de enfrentar uma crise tão grave.

'Arquivo X' antecipou a Pandemia de Coronavírus?

Em um episódio de 'Arquivo X' ('F. Emasculata'), que foi um dos últimos da segunda temporada e que foi exibido em Abril de 1995, nós temos uma história muito parecida com essa que originou a atual Pandemia do Coronavírus.

Além disso, nas duas últimas temporadas da série, que foram exibidas em 2016 e em 2018, nós tivemos um plano elaborado pelo Canceroso (o grande vilão de 'Arquivo X') que leva ao início de uma Pandemia (provocada pelo 'Vírus Espartano') cujo objetivo era exterminar a humanidade para evitar que esta continue devastando a Terra.

Na série, o personagem Canceroso representa as forças que agem nos bastidores dos governos do mundo inteiro, elaborando e executando planos ultrassecretos, incluindo a disseminação de vírus e bactérias mortais entre a população.

Vários episódios da série tratam deste tema e tivemos até uma grande Mitologia na série que envolvia um 'Vírus Alienígena'. E um destes episódios sobre vírus mortais foi exibido na segunda temporada e possuir várias semelhanças com a atual Pandemia de Covid-19. O episódio se chama 'F. Emasculata' (02X22) e irei comentar o mesmo na sequência.
Scully, que é médica, usa uma máscara semelhante as que estão sendo usadas atualmente em função da Pandemia do Coronavírus. No episódio, o vírus transmissor contamina um grande  número de pessoas rapidamente, tal como acontece com o Covid-19.

Episódio 'F. Emasculata' (02X22)!

'Arquivo X' e um experimento secreto com um vírus mortal!  

Episódio 22 da 2a. Temporada: F. Emasculata (Título no Brasil: Emasculatas, O Vírus da Morte).

Exibição original nos EUA no dia 28/04/1995.

Direção: Rob Bowman; Roteiro: Chris Carter & Howard Gordon.

Trama do Episódio!

Uma prisão federal recebe um pacote estranho, em nome de Robert Torrence, um médico que trabalha com Biodiversidade na Costa Rica. 

Porém, o que ninguém na prisão sabia é que o pacote contém um pedaço de carne (uma pata ensanguentada de porco) que contém um inseto (F. Emasculata) que está  contaminado com um vírus mortal. O inseto é usado como hospedeiro pelo vírus, que ataca o sistema imunológico das pessoas. Ele provoca uma doença que é 'semelhante à gripe'.

O vírus se espalhou pela prisão e está matando os prisioneiros rapidamente, dizimando os mesmos em poucos dias. Quando percebem o que estava acontecendo, dois prisioneiros conseguem escapar da prisão federal, sendo que eles estão contaminados pelo vírus desconhecido, embora não saibam disso, e para o qual não existe nenhum tratamento.

Além disso, o governo censura todas as informações sobre o que aconteceu. Enquanto Scully investiga o que ocorre na prisão, Mulder vai atrás dos fugitivos, que podem espalhar a doença entre a população.

Cena do episódio em que uma vítima do vírus mortal é levada por funcionários do CDC (Centro de Controle de Doenças).

Mulder e Scully descobrem que tudo pode ser uma experiência controlada por uma grande companhia farmacêutica (a 'Pinck Pharmaceuticals') e que ela faz isso com a cumplicidade e proteção do governo dos EUA. Mulder vai atrás de Skinner, a fim de questionar porque ele e Scully haviam sido escalados para aquele trabalho, que não padrão do FBI.

Obs: O jornalista Pepe Escobar chama o consórcio de grandes indústrias farmacêuticas de 'Big Pharma'.

No escritório de Skinner, Mulder encontra o Canceroso, confortavelmente sentado no sofá, enquanto fuma o seu cigarro, e o acusa de estar escondendo informações da população. O Canceroso confirma, dizendo que isso é necessário para não gerar pânico entre a população.

Mulder diz para o Canceroso que o governo mente para as pessoas, para que elas se sintam seguras e o Canceroso responde, dizendo 'Fazemos isso todos os dias'. Assim, o episódio possui várias semelhanças com a realidade atual, em que temos uma brutal e mortal Pandemia de Coronavírus (Covid-19).

E isso não é mera coincidência. No episódio nós temos até a Scully e uma equipe médica usando o mesmo tipo de máscara que, agora, se tornou tão essencial.

Chris Carter sabia das coisas...

Anne Simon e Chris Carter: Ela trabalhou como consultora científica, sendo uma respeitada PhD em biologia molecular e genética.

Muitas pessoas podem se impressionar com as similaridades entre o que vimos neste episódio de 'Arquivo X' (de Abril de 1995) que foi exibido há 25 anos, e o que está acontecendo agora, nesta Pandemia de Covid-19 que se alastrou pelo mundo inteiro rapidamente, em poucos meses, e que já matou mais de 70 mil pessoas até o momento.

Isso acontece porque a série, embora fosse de ficção científica, trabalhava com uma consultora científica muito respeitada, chamada Anne Simon, uma PhD em biologia molecular e genética.

Anne Simon até chegou a escrever um livro chamado 'A verdadeira ciência por trás do Arquivo X', que foi publicado no Brasil.

Nesta publicação vemos a Anne Simon com o Chris Carter e com alguns atores da série (David Duchovny, William B. Davis e Mitch Pileggi).

Trailer do episódio:

Links:

"F. Emasculata" - Episódio de 'Arquivo X': 
http://arquivoxepisodes.blogspot.com/2010/03/02x22-f-emasculatas-emasculatas-o-virus.html

Informações sobre o episódio:
https://www.imdb.com/title/tt0751119/

EUA X China e a Pandemia do Coronavírus:
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-51966296

Itália já registrava casos de uma 'Pneumonia Estranha' em Novembro de 2019:
https://sol.sapo.pt/artigo/690193/de-uma-estranha-pneumonia-em-italia-ao-estadio-zero-e-a-tragedia

sábado, 8 de fevereiro de 2020

Quem foi a verdadeira "Maga" de Cortázar?

Quem foi a verdadeira "Maga" de Cortázar? - por Melisa Rabanales!
Julio Cortázar foi um dos grandes escritores da história da América Latina. 

Texto de Melisa Rabanales que foi publicado, em seu blog, no dia 07/10/2014.

A 'Maga' é um dos personagens mais famosos da literatura de todos os tempos, da obra mais importante de Julio Cortázar: 'Rayuela'.

Obs: No Brasil o livro se chama 'O Jogo da Amarelinha'.

Essa personagem se tornou, para muitos, o amor platônico por excelência e o ícone de qualquer livro romântico. Mas a pergunta de um milhão de dólares é: Quem foi a inspiração de Cortázar para reencarnar a mítica Maga? Quem foi ela, realmente?

Após a publicação de 'Rayuela', muitas juraram ser 'La Maga'.

Várias amantes, amigas e escritoras alegaram ser a modelo pelo qual o escritor havia criado a famosa personagem, mas de todas elas, apenas duas criaram polêmica.

A escritora Alejandra Pizarnik foi a primeira a se declarar a fonte da inspiração, sendo que ela mesma declarou "A Maga sou eu". No entanto, algum tempo depois, veio a público o nome de Edith Aron, que para muitos é realmente a Lucia, ou 'A Maga', como é mais conhecida.
Alejandra Pizarnik dizia que ela havia sido a fonte de inspiração para Cortázar criar a 'Maga', mas ele negou isso posteriormente.

"A Maga sou eu"!

Bastien Galván (2014), em uma nota jornalística que ele escreveu na publicação 'Cultura Coletiva', diz que Pizarnik é a mais próxima de 'La Maga'. A escritora disse que ela foi a primeira a ler 'Rayuela' e até enviou uma carta a Julio dizendo "... seu livro doeu".

Também se reconheceu que ela e o escritor eram bons amigos e sempre negavam que fossem qualquer outra coisa. No entanto, ela tinha um temperamento muito variável e era vítima de depressão constante (um pouco como 'La Maga').

Foi mesmo Cortázar quem a ajudou em vários episódios quando ela queria se suicidar, no entanto, todas essas tentativas falharam porque ela conseguiu se matar por meio de uma overdose.

Apesar das declarações de Pizarnik, muitos continuam negando que ela tenha sido a inspiração do amor de Olivera em 'Rayuela'.

Segundo o jornal 'La Razón' (2013), Alejandra não tinha nada a ver com 'La Maga' e o próprio Cortázar escreveu em uma carta para sua amiga Ana María Barrenechea em 1982, onde explica: “Alejandra nunca teve nada a ver com o caráter da personagem Maga".

Edith Aron foi a principal inspiração para a criação da 'Maga' por Cortázar, mas ela mesma reconhece que a protagonista do livro é uma personagem literária.

EDITH ARON

Em uma entrevista concedida, aos 81 anos, ao jornal 'La Nación', Colômbia (2005), Aron lembrou-se de ter encontrado Cortázar em um navio que foi Buenos Aires a Paris em Janeiro de 1950.

Por sua vez, ela concordou em ter um relacionamento com o escritor enquanto estava em Paris, mas que ela não queria morar com ele porque ele queria continuar estudando. No entanto, ele esclareceu que mais tarde, quando o escritor se casou com Aurora, isso doeu.

"Sua decisão de casar com ela me machucou muito. Ele queria que continuássemos amigos e me convidava para ir a sua casa, mas isso me machucou."

Mas o que torna forte a teoria de que Edith era a verdadeira Maga foi que, na mesma entrevista, ela disse: “Ele me escreveu dizendo que havia baseado seu personagem em mim, e coisas espontâneas como as do romance estavam acontecendo conosco. 

Há também alguns episódios, como o em que encontramos um velho guarda-chuva nas ruas de Paris e fizemos uma cerimônia fúnebre, que aconteceu mais ou menos como ele conta. Mas 'A Maga' é uma personagem literária."

Então, quem foi a inspiração para a personagem feminina de 'Rayuela'?

Julio Cortázar em sua amada Paris. Ele nasceu em Bruxelas em 26/08/1914, mas era argentino e, no fim da vida, recebeu a nacionalidade francesa. Ele faleceu em 12/02/1984, aos 69 anos. 

Para quem leu 'Rayuela', é claro que 'La Maga' é tão imperfeita que se torna pura perfeição. Ela é uma mera personagem literária, como a própria Edith disse. Para mim, a Maga não era ninguém e ao mesmo tempo eram todas.

Foi o próprio Cortázar quem se juntou a si mesmo, e às mulheres mais importantes de sua vida, para criar uma personagem fabulosa. Ninguém pode realmente ser como a Maga. Que mulher poderia? É uma mera idealização.

Que poderia ter sido Alejandra, eu realmente descarto, porque ele mesmo negou e, além disso, não existem mais evidências além daquilo que saiu de sua boca. Por outro lado, Aron, pode ter contribuído para a criação da personagem.

Talvez aquela edição que ele lhe deu, e que ela destruiu a primeira página com a dedicatória, tenha sido a última peça que se encaixa nesse quebra-cabeças.

Embora não devamos esquecer que agora que Cortázar está morto, e que seu trabalho se tornou um dos maiores da história da literatura, qualquer mulher gostaria de ser a fantástica MAGA.

Escrito por Melisa Rabanales: Fã de Cortázar, jornalista em potencial, atleta e pessoa normal o resto do tempo. Aqui tem um pouco de tudo.
Edição comemorativa dos 50 anos do clássico 'Rayuela', da Real Academia Espanhola, que foi a obra de Cortázar que teve o maior impacto.

Links:

Texto original, de Melisa Rabanales:
https://medium.com/@mel_delaroca/quien-era-la-verdadera-maga-de-cortazar-370866d4eb29

Entrevista com Davi Arrigucci Jr. sobre 'Rayuela'/'O Jogo da Amarelinha' - Parte 1:
https://www.youtube.com/watch?v=6BcwNPQnJj8&t=34s

Entrevista com Davi Arrigucci Jr. sobre 'Rayuela'/'O Jogo da Amarelinha' - Parte 2:
https://www.youtube.com/watch?v=TuxLIEymJdQ

Alejandra nunca teve nada a ver com a Maga:
http://www.la-razon.com/index.php?_url=/suplementos/tendencias/Cortazar-Alejandra-ver-Maga_0_1847215371.html

Julio Cortázar: A biografia do grande intelectual argentino:
https://amenteemaravilhosa.com.br/julio-cortazar-biografia-intelectual-argentino/

'Rayuela' - 50 Junhos depois:
https://www.sul21.com.br/postsrascunho/2013/06/a-rayuela-cinquenta-junhos-depois/

Julio Cortázar: Edit Aron foi a mulher que inspirou a Maga:
https://www.elhistoriador.com.ar/carta-de-julio-cortazar-a-edith-aron-la-mujer-en-la-que-se-habria-inspirado-cuando-creo-su-personaje-la-maga/
'O Jogo da Amarelinha' em sua edição mais recente no Brasil.

La Maga de Cortázar:
https://culturacolectiva.com/historia/la-maga-de-cortazar

Tragam Cortázar de volta:
https://www.fronteiras.com/artigos/alejandro-zambra-tragam-cortazar-de-volta

Roberto Bolaño - O melhor herdeiro de Cortázar:
http://www.diariosigloxxi.com/texto-diario/mostrar/1664916/roberto-bolano-mejor-heredero-julio-cortazar

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Relação de Longas-Metragens de Jean-Luc Godard!

Relação de Longas-Metragens de Jean-Luc Godard!




1) Acossado (1960);

2) Le Petit Soldat (1961);

3) Uma Mulher é Uma Mulher (1961);

4) Viver a Vida (1962);

5) Tempo de Guerra (1963);

6) O Desprezo (1963);

7) Bande à Part (1964);

8) Uma Mulher Casada (1964);

9) Alphaville (1965);

10) Pierrot le Fou (1965);

11) Masculino-Feminino (1966);

12) Made in USA (1966);

13) Duas ou Três Coisas Que Eu Sei Dela (1967);

14) A Chinesa (1967);

15) Week-End (1967);

16) One Plus One/Sympathy for the Devil (1968);

17) Um Filme como os Outros (1968);

18) One American Movie/One Parallel Movie (1968-1971);

19) A Gaia Ciência (1969);

20) Pravda (1970);

21) British Sounds (1970);

22) O Vento do Leste (1970);

23) Até a Vitória (1970; inacabado);

24) As Lutas Ideológicas na Itália (1971);

25) Vladimir et Rosa (1971);

26) Tudo vai Bem (1972);

27) Carta para Jane (1972);

28) Numéro Deux (1975);

29) Comment ça va? (1976);

30) Aqui e em Qualquer Lugar (1976; inclui Até a Vitória);

31) Salve-se Quem Puder (1980);

32) Salve a Vida (quem puder) - (1981);

33) Passion (1982);

34) Prénom: Carmen (1983);

35) Je Vous Salue, Marie (1985);

36) Détective (1985);

37) Soft and Hard (1985);

38) King Lear (1987);

39) Atenção à Direita (1987);

40) Nouvelle Vague (1990);

41) Allemagne 90 neuf Zéro (1991);

42) Helas Pour Moi (1993);

43) JLG/JLG - Autportrait de Décembre (1994);

44) For Ever Mozart (1996);

45) Éloge de L'Amour (2001);

46) Notre Musique (2004);

47) Film Socialisme (2010);

48) Adieu au Langage (2014);

49) Le Livre D'Image (2018).

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

'Helas Pour Moi' - Godard mostra a busca espiritual por um conhecimento que a humanidade perdeu!

'Helas Pour Moi' - Godard mostra a busca espiritual por um conhecimento que a humanidade perdeu! - Marcos Doniseti!
'Helas Pour Moi' (Infelizmente Para Mim; 1993): Um belo filme de Godard, que mostra que a humanidade se afastou da dimensão espiritual da vida.

A trajetória de Godard e a produção de 'Helas Pour Moi'!

Este filme faz parte do chamado 'Período Tardio' (como o denominou o crítico Jonathan Rosenbaum) da obra de Godard, que seria a terceira fase (ou quarta, dependendo dos critérios usados) da carreira do cineasta franco-suíço que começou com o lançamento, em 1980, de 'Sauve qui peut (la vie), o belo filme que marcou o seu retorno ao circuito comercial e aos festivais de Cinema. 

Antes deste período nós tivemos a fase 'Nouvelle Vague', que vai de 'Acossado' (1960) até 'Weekend' (1967), ao final do qual Godard anunciou para a equipe de técnicos, com os quais ele trabalhava há muito tempo, que estava abandonando o Cinema e que eles poderiam procurar trabalho em outros lugares, com outros cineastas. Por isso mesmo que no fim de 'Weekend' vemos escrito 'Fim da História. Fim do Cinema', pois Godard não tinha mais intenção de continuar filmando. 

Aliás, quando Philippe Garrell e Bernardo Bertolucci ficaram sabendo que Godard não tinha mais intenção de fazer filmes, ambos reagiram da mesma maneira, dizendo que ele não poderia fazer isso pois, na visão deles, Godard é quem mostrava o caminho que os outros cineastas deveriam seguir. 

Posteriormente, Godard entrou na sua fase Maoísta ou Revolucionária, quando fez parte do 'Grupo Dziga Vertov' (1968-1972), que ele criou junto com Jean-Pierre Gorin, quando procurou não apenas fazer filmes sobre temas políticos, mas fazer filmes politicamente. 

É bom deixar claro que os
filmes do período Maoísta e Revolucionário de Godard, que inclui aqueles que foram feitos na época do 'Grupo Dziga Vertov', não foram realizados para agradar ao grande público e nem para ser exibidos no circuito comercial e tampouco em festivais. Estes filmes tinham, de fato, finalidade política e revolucionária.

'As Mulheres de Argel', quadro de Eugène Delacroix. Os filmes de Godard sempre fazem muitas referências à Pintura. Consta que ele chegou a pintar um quadro na juventude, pois pensava em se tornar um pintor, mas percebeu que não tinha muita vocação para isso. Mas a sua paixão pela Pintura sempre ficou clara nos seus filmes.

Nestes filmes que fizeram juntos na época do 'Grupo Dziga Vertov' (Vento do Leste; Lutas Ideológicas na Itália; Vladimir e Rosa; Tout va Bien e Carta para Jane) Godard e Gorin tentaram levar adiante um processo de formação política e ideológica de estudantes e operários visando difundir a ideia de uma Revolução Socialista. Já nos anos 1970, Godard também realizou, junto com Anne-Marie Miéville, trabalhos para a TV e pesquisas com Vídeo.

Além dos filmes citados, Godard e Gorin foram convidados pela 'Al Fatah' (organização que fazia parte da OLP) para fazer um filme sobre a luta dos Palestinos ('Até a Vitória'), que eles apoiavam, e que foi filmado na Jordânia, em 1970. 

Mas o massacre que o governo jordaniano promoveu contra os Palestinos, em Setembro daquele de 1970, impediu que o mesmo fosse concluído. Godard incluiu o 'Até a Vitória' em um filme posterior, que foi o 'Aqui e em Qualquer Lugar' (1976), que filmou junto com Anne-Marie Miéville. 

Nesta fase Godard também chegou a ir até a Tchecoslováquia, em Março de 1969, onde fez 'Pravda', de forma clandestina. Depois, ele foi para o Reino Unido, onde filmou 'British Sounds'. Estes dois filmes foram resultado de uma colaboração, principalmente, com o jovem maoísta Jean-Henri Roger.

Depois, Godard foi para os EUA, onde ficou em Outubro e Setembro de 1968, e fez muitas filmagens sobre a chamada 'Nova Esquerda' dos EUA (Direitos Civis, Black Panthers, Movimento Estudantil, Rock Psicodélico, Contracultura) para um filme que deveria se chamar 'One A.M.' (One American Movie). No filme, Godard contou com a colaboração de D. A. Pennebaker e Richard Leacock, dois documentaristas ligados ao chamado 'Cinema Verdade'.

Porém, Godard não concluiu o filme e, em 1971, D.A. Pennebaker pegou o material que havia sido filmado por Godard, acrescentou algumas cenas e finalizou o mesmo, que ganhou o título de 'One Parallel Movie', que foi lançado em 1971. 
Bernanrd Verley interpreta o jornalista Abraham Klimt neste belo e poético filme de Godard, que é marcado por uma busca espiritual. Ele está escrevendo um livro sobre a vinda de Deus à Terra e o envolvimento Dele com uma mulher, mas faltam algumas informações para completar o mesmo.

Neste período, nos primeiros anos da década de 1970, após o fim do 'Grupo Dziga Vertov' (que ocorreu em 1972), Godard trabalhou com a artista multimídia, de origem suíça, Anne-Marie Miéville, que foi fundamental para que Godard desse início a uma nova fase, se reinventando novamente. Eles chegaram a viver juntos durante um certo período de tempo.

Com isso, ele passou a realizar filmes que tratavam de aspectos do cotidiano e da vida pessoal dos personagens, e que estavam claramente conectados com uma busca espiritual. 

Outros elementos da sua fase anterior permaneceram neste 'Período Tardio', como as referências e comentários a respeito de acontecimentos históricos, tal como a Guerra da Bósnia (1992 a 1995), que é citada em 'Helas Pour Moi' (1993) e também em 'For Ever Mozart' (1996).

'Helas Pour Moi' é uma produção de 1993 e contou com a participação de Gérard Depardieu, mas consta que o mesmo abandonou as filmagens ainda quando elas estavam na metade, o que não impediu que Godard concluísse o filme. 

Em ‘Infelizmente Para Mim’, Gérard Depardieu é quem interpreta Deus e, também, Simon, que é o marido humano e mortal de Raquel. Enquanto isso, a ruiva Raquel é interpretada pela atriz francesa Laurence Masliah, que já havia trabalhado com Godard no filme Soigne ta droite’ ('Atenção à Direita'; 1987).
Uma estudante folheia um livro de Pintura, que sempre exerceu uma grande influência sobre Godard, um apaixonado por essa forma de Arte. No filme temos referências a Delacroix e Gustav Klimt.

O filme é dividido em cinco 'livros'. E em vários momentos vemos intertítulos e frases sobre um fundo negro, que interrompem as imagens, mas não as falas dos personagens, e cujo conteúdo está diretamente relacionado com a trama, tais como:

- Em Busca de Deus;
- Proposta de Cinema;
- A Lei do Silêncio;
- Somos esperados na Terra;
- De Certas Coisas;
- O Passado Nunca Morre;
- O Homem é a Sombra de Deus para a Mulher que o Ama;
- Deste modo, gradualmente, o Passado volta ao Presente através da encenação Imaginária de uma Experiência Visual que sempre solicita vários Olhares;
- E o Outro está no Único;
- E estas são as Três Pessoas;
- Nem Criatura, Nem Criador;
- Todos dormiram, como se todo o Universo fosse um enorme erro;
- Simon não amou você em vão, Não terei você para Amar por nada;
- Eu não te vejo;
- Infelizmente Para Mim;
- Amar por nada;
- O Céu cava buracos entre as folhas de ouro;
- Todos estamos rodeados de sonhos invisíveis.
Abraham Klimt fuma um cigarro à beira do rio. E no gramado vemos dois remos cruzados, formando um símbolo que lembra argilas sumérias com imagens do deus Ninurta.

A Mitologia Grega, as referências e a trama de 'Helas Pour Moi'!

As tramas dos filmes de Godard são sempre muito simples. 

O que torna os seus filmes mais complexos são as inúmeras referências e citações sobre literatura, música, cinema, filosofia, pintura, mitologia, poesia que estão espalhadas pelo filme e que também estão, de alguma forma, relacionadas à trama, tornando-a muito mais complicada, o que leva muitas pessoas a afirmar que os seus filmes seriam 'obscuros e impenetráveis'.

Os filmes de Godard também estão sempre repletos de experimentos visuais e sonoros inovadores e incomuns. 

Assim, neste filme, temos a presença de várias vozes que são ouvidas de forma  simultânea durante o filme e que, em alguns momentos, não são apenas dos personagens que vemos na tela, mas também de outros que nunca aparecem, como a de vários (as) narradores (as) que, de uma forma ou de outra, dialogam com os personagens visíveis e com a trama do filme. 

Assim, a história de ‘Helas Pour Moi’ é baseada em um texto do poeta italiano Giacomo Leopardi (que é citado no filme) sobre os sofrimentos de um Deus que acompanha a existência atribulada dos seres humanos que ele criou e, também, se inspira na Mitologia Grega, quando Zeus vem à Terra para se relacionar com uma bela mulher (Alcmena) que é a esposa de Anfitrião, que se encontrava ausente, combatendo em uma guerra. 

Anteriormente, em outra guerra, Anfitrião acabou matando, acidentalmente o seu próprio sogro, Electrião (foi o chamado 'fogo amigo'), e por isso Alcmena exigiu que ele voltasse a lutar contra o mesmo inimigo anterior (o Rei Ptérela, de Tafos), continuando a combater na guerra em que o pai dela havia morrido. 
Nelly, o livreiro Jack e dois pastores protestantes conversam sobre a Mitologia da antiga Babilônia, civilização que construiu inúmeros Zigurates, que serviam para que os 'deuses' pudessem vir à Terra.

Desta maneira, Zeus aproveita a ausência de Anfitrião e se faz passar por ele, assumindo a sua aparência e assim consegue seduzir Alcmena por três noites seguidas, pois ela (que era inteiramente fiel ao seu marido) pensava que estava se relacionando com o esposo que havia retornado da guerra. Inclusive, é do relacionamento amoroso de Zeus com Alcmena que nós teremos o nascimento de Héracles (Hércules), o maior dos heróis gregos.

Neste filme vemos que Godard, tal como aconteceu nos primeiros anos do seu ‘Período Tardio’, mostra claramente o seu desejo de realizar uma busca espiritual (vide também os filmes 'Passion', de 1982, e ‘Je Vous Salue, Marie’, de 1985), em direção ao Divino e ao Sagrado, tentando uma aproximação entre o ser humano e as forças divinas (ou apenas Divina) que o teriam criado. 

Nesta adaptação, Godard fez algumas mudanças em relação à história original, incluindo os nomes dos personagens. Assim, o Zeus da Mitologia Grega torna-se o Deus cristão, Alcmena passa a se chamar Raquel e Anfitrião se torna Simon (Simão; Pedro).

Simon e Raquel são casados, fiéis e felizes, sendo pequenos proprietários de uma oficina mecânica, em uma pequena cidade do interior da Suíça, que estão se preparando para comprar um hotel. É durante a viagem de Simon para concluir a compra do mesmo que o próprio Deus cristão (e não mais o Zeus grego) decide vir à Terra para ter um relacionamento amoroso com Raquel e vivenciar uma situação semelhante à de muitos humanos.

Aliás, a presença e domínio dos elementos claramente religiosos no filme já fica claro pelos nomes dos personagens: Abraham, Simon, Raquel, Benjamin...
A água simboliza, entre outras coisas, transformação, purificação e renascimento. E Raquel passará por uma experiência transformadora.

Durante o filme vemos, como já é habitual nos filmes de Godard, frases, aforismos, citações literárias, históricas, pictóricas, filosóficas e, é claro, religiosas e mitológicas que estão de alguma forma relacionadas à trama.

Em uma delas, por exemplo, temos a citação dos livros ‘O Manifesto do Partido Comunista’ (Marx e Engels) e de ‘Alice no País das Maravilhas’ (de Lewis Carroll) que, aliás, também foram citados em ‘Made in U.S.A’, filme de 1966 de Godard. Os livros 'Lord Jim' (de Joseph Conrad) e 'O Homem Magro' (de Dashiell Hammett) também são citados no filme, com a leitura de alguns trechos dos mesmos. 

Também vemos um cartaz de Stendhal afixado na porta de uma livraria e temos uma personagem chamada Marinette Duras, o que é uma referência à escritora francesa de quem Godard foi amigo. E o nome de família de Raquel é Donnadieu, que também era o nome de família de Marguerite Duras (que foi escritora e cineasta). Logo, esta se chamava Marguerite Donnadieu.

Também temos várias referências à Pintura, como ao quadro 'As Mulheres de Argel' (de Eugène Delacroix) e ao pintor austríaco Gustav Klimt. 

E é claro que existem referências cinematográficas, como citações ao cineasta francês Jean-Marie Straub e a Alfred Hitchcock (vemos um trecho do seu filme 'I Confess' ser exibido em um aparelho de TV). E também temos pôsters do consagrado ator francês Michel Simon e do filme 'Antígone' (de Jean-Marie Straub e Danièle Huillet) afixados em uma locadora de vídeo (sim, na época elas ainda existiam).

Godard também faz uma referência à sua origem familiar, pois a professora de literatura da escola local tem o nome de família Monot, que se parece com Monod, que era o nome de família da mãe de Godard, que se chamava Odile Monod, que era integrante de uma rica família de banqueiros suíços protestantes. 
Raquel e Simon conversam, antes da chegada de Deus, observados por Nelly. Em 'Helas Pour Moi' vemos belas imagens filmadas por Godard e um belo uso da fotografia, que se relaciona com os diálogos e frases que são ditas. 

A conexão entre as reflexões e a trama do filme!

O filme também é marcado pela presença de inúmeras reflexões (filosóficas, mitológicas, religiosas, históricas...). Um exemplo disso é a frase dita pelo dono da livraria a alguns estudantes, que fala o seguinte: "Eu digo a vocês, crianças, a Pintura não revelará o caminho para a visão exterior do Universo". E um narrador também diz que "Os pintores não revelaram o segredo do sofrimento". 

Estas afirmações são coerentes com uma outra, feita em outro momento, na qual é dito que a linguagem cinematográfica é imperfeita, o que mostra que Godard possui total consciência de que não é possível, ao ser humano, conhecer toda a realidade e toda a verdade, seja sobre o Universo, a Natureza ou sobre o próprio Homem. 

Outra afirmação feita por um narrador (há varias vozes no filme... elas não são apenas dos personagens) é a seguinte: '... Em uma contemplação quase ciumenta do rosto e dos gestos humanos. É na luz que alguém deve compor para iluminar, com a harmonia das estrelas mais distantes, a escuridão mais gritante'. 

Uma possível interpretação para isso é que Deus chega a quase sentir inveja das sensações e da beleza humanas e que é justamente em função disso que ele decide vir à Terra para experimentar tais sensações e sentimentos, escolhendo sentir e vivenciar o que é amar e ser amado por uma mulher (Raquel, a mulher de Simon). 

Em outro momento, no início do filme, um narrador pergunta o seguinte: "A voz dos amigos não é, às vezes, assombrada pelo eco daqueles que nos precederam na Terra? E a beleza das mulheres de outrora não se parece com a das nossas amigas?". 
Abraham Klimt conversa com uma moradora (Aude) para ver se consegue confirmar a história sobre um relacionamento amoroso entre Deus e Raquel.  Assim, Godard usa do recurso do flashback para contar essa história que se baseou na Mitologia Grega.

E daí o narrador continua e diz o seguinte: "Cabe a nós compreender que o passado requer redenção e uma parte muito pequena dele está, talvez, ao nosso alcance. Há um encontro misterioso entre as gerações passadas e as nossas. Éramos esperados na Terra". Portanto, Godard estabelece, claramente, a existência de uma ligação que existe entre as gerações humanas do passado e as do presente. 

E depois uma narradora fala o seguinte: "Nossa época está em busca de uma pergunta perdida, como se estivesse cansada de respostas adequadas". Entendo que, neste trecho, Godard está dizendo que a Ciência, a Modernidade, não nos permite acessar ao mundo espiritual e, assim, os seres humanos procuram por esse contato, mas sem que as pessoas saibam o que seria possível fazer para se atingir esse objetivo. 

Portanto, Godard estabelece uma nítida conexão entre o passado e o presente da humanidade, pois ainda temos a existência, em nossa época, de alguns elementos da Antiguidade entre nós. Logo, isso permitiria que um acontecimento como aquele que envolveu Zeus e Alcmena pudesse vir a se repetir em nosso tempo. 

Isso explicaria uma frase que é dita por um dos personagens, que é a seguinte: "Se a França permitir um ressurgimento da Religião, será com grande alegria pelo divino que estará entre todos nós". 

E a professora de Literatura (Anne) fala, para o seu marido (o pastor Eric), uma frase de Mallarmé, que é a seguinte: "Declarações falsas são pesos mortos que carregamos por anos". Oras, a história do filme gira em torno da busca feita por um jornalista (Abraham Klimt) e que irá basear as suas conclusões nas declarações dos moradores locais, às quais ele não saberá se são verdadeiras ou não, pois elas são contraditórias.
Gérard Depardieu interpreta Deus, que vem à Terra acompanhado de um anjo, que o ajuda a encontrar uma mulher fiel e honrada com a qual Ele possa ter um relacionamento amoroso. O momento em que Deus colocou o chapéu em Simon foi quando entrou no corpo deste.

Em uma fala de um dos personagens (um pastor protestante) também é dito que os 32 Zigurates construídos na época da Babilônia eram locais que tornavam possível a descida dos deuses à Terra, o que está diretamente relacionado à trama do filme, que trata justamente da descida de Deus à Terra para ter um relacionamento amoroso com uma mulher mortal e humana.

Obs1: Segundo estudiosos, os Zigurates eram também os templos nos quais os Deuses mitológicos ficavam, eram as suas moradas quando vinham ao nosso planeta. Assim, a ‘Torre de Babel’, construída na Babilônia e que é citada no 'Velho Testamento', era um Zigurate que possuía 90 metros de altura e que continha um templo que foi construído em homenagem ao deus babilônio Marduk.

Em uma cena, também no início do filme, vemos dois remos cruzados, à beira de um rio, enquanto Abraham Klimt fuma um cigarro. Estes dois remos cruzados formam um símbolo que é encontrado em argilas sumerianas que contém a imagem do deus Ninurta, que era, entre outras coisas, o deus sumeriano da água, que fertilizava o solo. 

Tal fato mostra que Godard pesquisou sobre o assunto a fim de poder fazer o filme, comportamento que é bastante antigo na carreira do cineasta franco-suíço. Assim, para fazer 'A Chinesa' (1967) ele conversou com estudantes maoístas da época e o jovem maoísta Jean-Pierre Gorin foi um consultor do filme. 

Logo, há uma nítida e clara conexão entre estas reflexões e a trama do filme. Então, se isso acontece, como é que alguém pode afirmar que os filmes de Godard são 'herméticos e incompreensíveis'.

Deus chega à casa de Raquel, que se espanta ao ver um homem que é semelhante ao seu marido, que havia viajado e que não deveria estar ali.

Isso é um absurdo e tal postura é resultado mais da falta de vontade das pessoas em parar, pensar e pesquisar sobre o que Godard mostra e diz em sua vasta e genial obra do que pelo fato de que os seus filmes seriam 'obscuros' e impossíveis de se compreender. Tal obscuridade e incompreensão da obra de Godard existe apenas para quem tem preguiça de pesquisar e de pensar a respeito da mesma. 

Além de usar destas inúmeras reflexões, a história do filme também é contada e explicada por meio do uso da memória, que é um tema de grande importância nos filmes que Godard realizou neste chamado 'Período Tardio', principalmente no belíssimo "Éloge de L'Amour" (2001). 


A trama do filme!

O filme começa quando um editor e jornalista chamado Abraham Klimt (interpretado por Bernard  Verley) chega a uma pequena cidade do interior da Suíça para confirmar a veracidade de uma fantástica história que ele ouviu e que dizia que Deus teria vindo à Terra para saber o que é sentir amor por uma mulher e ser amado por ela.

Klimt conversa com os moradores locais que, espera ele, se lembrariam de como teria se desenvolvido essa fabulosa história, que teria envolvido o Todo-Poderoso e a fiel e leal Raquel, esposa de Simon. Sua principal fonte de informação será a jovem Aude Amiot. E quando ela, Raquel, pergunta para o Todo-Poderoso porque a escolhera, Deus responde que fez isso justamente por ela ser uma mulher fiel ao seu marido. 

Klimt pergunta aos moradores, especificamente, o que aconteceu na tarde de 23 de Julho de 1989, pois ele está escrevendo um livro sobre o que aconteceu naquele dia e ainda estão faltando algumas páginas para completar a obra. Porém, ele irá ouvir respostas diferentes e contraditórias a respeito do que Raquel estava fazendo naquele dia. 
Após uma noite de amor com Deus, a fiel Raquel ainda está confusa sobre o que aconteceu.

Aliás, durante o filme vemos Godard fazer experimentos sonoros, com várias pessoas falando ao mesmo tempo, diálogos e frases que são ditas por personagens que não aparecem na imagem ou que envolvem pessoas do mundo espiritual. 

Em alguns momentos ouvimos uma voz, que é a de Deus, e que se parece com a do filme 'Alphaville' (1965), o único filme de ficção científica da carreira de Godard, nos quais o Todo-Poderoso conversa com o anjo (Max) que o acompanha em sua vinda à Terra. 

Desta forma, em alguns momentos vemos Deus e um anjo (Max) que o acompanha nesta viagem à Terra (deve ser um anjo, embora o mesmo não seja identificado como tal) conversando a respeito da chegada dele à Terra e sobre que tipo de mulher seria Raquel e que tipo de homem seria o seu marido, Simon.

No filme, Godard diz que as pessoas, do mundo atual, se afastaram do mundo espiritual, do Sagrado, do Divino, e perderam a capacidade de orar e de se conectar com o mundo dos Deuses ou de Deus. 

Esse é, claramente, o tema principal deste seu belo filme. Logo, se podemos perceber do que trata o filme e quais são os elementos que estão presentes no mesmo, então como podemos afirmar que este filme de Godard possuiria um caráter 'obscuro e impenetrável'?
Depois que descobriu com quem havia tido um relacionamento amoroso, Raquel adota uma postura de submissão.

Assim, logo no começo do filme, vemos o jornalista Klimt fazer algumas afirmações que resumem qual é a essência de 'Helas Pour Moi'. Isso acontece quando ele diz que, antigamente, o seu bisavô, quando tinha uma missão difícil para cumprir, caminhava em direção a uma floresta, acendia uma fogueira, orava silenciosamente e cumpria com a sua tarefa.

Depois, o seu avô fazia o mesmo, cumprindo a mesma tarefa, mas já não sabia acender a fogueira, limitando-se a orar, mas assim mesmo ele cumpria com a sua tarefa. E daí o pai de Klimt já não sabia nem acender a fogueira e tampouco fazer as orações, mas sabia o local exato onde tudo aconteceu e, assim, cumpria com a sua tarefa.

E finalmente,  o próprio Klimt admite que não sabe fazer nada do que o seu bisavô, seu avô e o seu pai fizeram, mas diz que ele sabe contar uma história e que isso é o suficiente.

Assim
, neste momento inicial, Godard já deixa claro que o filme trata do processo de perda de contato da humanidade com o mundo espiritual, mostrando que o ser humano se afastou da dimensão do Sagrado, do Divino, e que não sabe mais como proceder para entrar em contato com o mundo do Espírito. O ser humano não domina mais tal conhecimento que, antigamente, permitia que ele se conectasse com o Divino.

Desta maneira, Godard diz que sabemos que histórias fantásticas e fabulosas aconteceram em outras épocas, há muito tempo, mas que não temos mais o conhecimento dos Antigos, que foi perdido pela humanidade, e que nos limitamos a tentar descobrir o que teria acontecido. Portanto, contar histórias é a única coisa que o ser humano ainda consegue fazer, segundo Godard. 
Deus em meio à água, logo após ter uma relação amorosa com Raquel. Ele se apoderou corpo de Simon para poder fazer amor com a esposa deste.

Mas, mesmo neste aspecto, o cineasta demonstra ter consciência de que mesmo essa capacidade possui os seus limites, dizendo que que a linguagem do Cinema é imperfeita. Em 'Passion', filme de 1982, Godard diz que o Cinema não tem como apreender toda a realidade conseguindo, no máximo, promover uma aproximação da realidade, mas não há como conhecer tudo. Essa ideia é retomada em 'Helas Pour Moi'.

Porém, Klimt acredita que isso seria o suficiente para que ele pudesse descobrir quando, onde e em quais circunstâncias Deus e Raquel teriam tido o seu relacionamento amoroso. E para saber o que aconteceu é que ele irá conversar com os moradores locais. No entanto, ao final da trama ele ficará em dúvida sobre o que de fato aconteceu, se é que aconteceu alguma coisa, pois irá ouvir versões diferentes e contraditórias sobre o que ocorreu. 

Obs2: Gustav Klimt foi um pintor simbolista austríaco e que viveu entre 1876 e 1918. Assim, esta é mais uma das referências ligadas à Pintura que temos no filme. A obra 'Mulheres de Argel', de Eugène Delacroix, também é citada no filme. Aliás, essa pintura tem duas versões, sendo uma de 1834 e outra de 1849, na qual Delacroix fez várias mudanças em relação à pintura anterior. Godard também costuma fazer o mesmo, usando uma mesma frase em vários filmes, mas sempre fazendo alguma mudança na mesma.

E durante o desenvolvimento da trama nós também vemos a reação de perplexidade e incompreensão da própria Raquel, pois o seu marido (Simon) tinha saído da cidade para fechar um negócio, de compra de um hotel, e não voltaria senão depois de alguns dias. 
Deus observa Raquel, mulher pela qual se apaixonou, em uma belíssima sequência do filme de Godard. Deus lhe perguntou se ela gostaria de se tornar imortal, mas ela preferiu continuar vivendo com Simon, seu marido humano e mortal.

Porém, um homem semelhante à Simon aparece na mesma noite e ela fica confusa, pois apesar da sua aparência ele não parece ser, de fato, Simon. E mesmo na manhã seguinte à noite de amor com aquele homem que é igual ao seu marido, mas que não é o mesmo, ela ainda está muito confusa e tentando entender o que, afinal, havia acontecido. 

Tal homem é, de fato, Deus, que revela para uma confusa Raquel quem Ele é. E somente depois de muitas horas, após ter feito amor com Ele, é que ela irá perceber quem Ele é. E no fim o próprio Deus descobre-se apaixonado por Raquel. 

Deus pergunta para Raquel se ela não gostaria de se tornar imortal, mas ele diz que não, pois prefere  voltar a viver normalmente com o seu marido, humano e mortal. Quanto a Abraham Klimt, ele irá embora com a eterna dúvida a respeito do que aconteceu naquela pequena cidade do interior da Suíça. 

Portanto, o ser humano teria perdido até mesmo a capacidade de contar uma história, que seria a única herança da Antiguidade que a humanidade teria preservado. Mas, para Godard, nem mesmo isso é mais possível. 

Este é mais um belo filme de Godard e que exige, sim, um esforço intelectual significativo de quem o assiste, para que o mesmo possa ser melhor compreendido, mas ele está longe de ser, como se diz por aí, um filme 'hermético', ou seja, de que o 'Helas Pour Moi' seria impenetrável, obscuro e incompreensível.

Mas quem se aventurar a fazer esse esforço e estiver disposto assistir e a tentar compreender este belo 'Helas Pour Moi', com certeza não irá se arrepender, pois tal como é dito no filme, por um dos personagens (um pastor protestante), “A sabedoria não é para aquisição de conhecimento, e sim de aventura’.
No final, ao ser questionado por Klimt, Simon diz que nada aconteceu e que foi ele que voltou para casa antes da hora e que, portanto, foi ele mesmo quem se relacionou com Raquel naquela noite. E Klimt vai embora sem saber o que aconteceu. 

Informações Adicionais!

Título: Helas Pour Moi (Infelizmente Para Mim);
Diretor: Jean-Luc Godard;
Roteiro: Jean-Luc Godard;
País de Produção: França e Suíça;
Ano de Produção: 1993;
Fotografia: Caroline Champetier; 
Duração: 83 minutos; 
Gênero: Drama;
Elenco: Gérard Depardieu (Deus/Simon Donnadieu); Laurence Masliah (Raquel Donnadieu); Bernard Verley (Abraham Klimt); Aude Amiot (Aude); Roland Blanche (Jack; livreiro/professor de desenho); Jean-Louis Loca (Max); Benjamin Kraatz (Benjamin); François Germond (pastor protestante); Anny Romand (Anne); Manon Andersen (Ondine).

Links:

Folha de S. Paulo - Inácio Araújo:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1994/8/12/ilustrada/16.html

A história de Zeus e Alcmena:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Alcmena

Trailer do Filme: